Ontem meu amigo Ronaldo Brito Roque, uma dessas inexplicáveis criaturas de Cataguases, brindou aos seus seletos leitores com um texto que realmente é destes que me dá vontade de ter escrito. Tenho isso, às vezes: leio alguma coisa e penso comigo que eu precisava ter sido o autor daquilo. O texto em questão é um delicioso conto sobre um restaurante que só serve três pratos; intitulados “o melhor”, “o médio” e “o pior”; e as reações dos fregueses a tal estranho cardápio.
Nas mãos de um reles autor de auto-ajuda isto provavelmente redundaria num texto de estilo parecido ao das “correntes de e-mail” que pululam na Internet, com uma moral bem tosca e óbvia ao final, para nos fazer ter algum tipo pasteurizado de “iluminação”. Mas Ronaldo Brito Roque não é um autor de tal naipe, mas um ironista hábil, que reduz a pó qualquer intenção moralista, e o texto termina mais fazendo troça do que ensinando.
Existem, claro, algumas falhas no texto. Especialmente o final, que poderia ter sido o melhor,* mas foi apenas o médio. Mas a habilidade do autor em evitar a pieguice faz com que o andamento geral da história recaia na sátira, e não na parábola filosófico-religiosa-self-service que agrada às massas.
Não vou falar muito mais sobre o texto, vou deixar que vocês o saboreiem com cuidado, e que se perguntem quantas vezes na vida não se contentaram em pôr umas alcaparras por cima de algo medíocre, torcendo para o cliente não saber reconhecer o melhor que você pode fazer.
*Pergunta-me o autor deste texto: “mas, afinal, de que forma você teria escrito o final?” É uma pergunta justa, tanto quanto é difícil de responder. É sempre muito mais fácil detectar algo “errado” do que sugerir o melhor conserto. Séculos antes da invenção do remédio a medicina já tinha o diagnóstico. Acredito que eu teria feito um final mais cético, no qual o cozinheiro não desse nenhuma lição de moral do tipo auto-confiança, valorização de si próprio, etc. Faltou ao cozinheiro um pouco mais de desprezo pelos fregueses. Não que uma dose extra de desprezo tornasse o texto mais crível. Literatura não tem que ser crível. Tem, aliás, que ser incrível. Coisas críveis eu leio nos jornais. Refiro-me apenas que tal atitude tornaria o todo mais harmônico. Pelo menos em minha modesta opinião.