Em um mundo eternamente provisório, efêmeras letras elétricas nas telas de dispositivos eletrônicos.
25
Dez 11
publicado por José Geraldo, às 10:20link do post | comentar

Como todos devem estar percebendo, este blog anda parado nas últimas semanas. As postagens que apareceram foram todas previamente agendadas, exceto as edições feitas na última semana, que foram poucas. Tudo isso é, como não poderia deixar de ser, fruto das festas de final de ano e suas consequências: este blogueiro, mesmo não se considerando oficialmente em férias, está dedicando um pouco mais de tempo a outras coisas (como minha recente dedicação ao outro blog). A tendência é que o Letras Elétricas só volte ao ritmo frenético de antes lá pelo mês de março. Mas podem aguardar um fluxo regular de postagens nesta entressafra, à razão de pelo menos oito por mês.


22
Dez 11
publicado por José Geraldo, às 23:15link do post | comentar | ver comentários (1)

Anteontem concluí a postagem do nova e melhorada versão do conto Os Estranhos e achei melhor mover todas as informações sobre ele para um texto em separado, se possível acrescentando um pouco mais de informação.

Os Estranhos é um conto de terror do gênero pós-apocalíptico inteiramente baseado em dois sonhos que eu tive, ao longo de uma mesma noite, em 1996. No primeiro sonho eu estava no jardim de uma casa estranha, no alto de uma montanha, acompanhado de pessoas desconhecidas, ocupado em livrar-me de um cadáver enquanto contemplava, cheio de pavor, a presença de criaturas que voejavam sobre o vale abaixo, deitando sua sombra sobre a cidade de onde, no sonho, eu tinha saído. No segundo sonho eu estava esgueirando pelas sombras de minha própria cidade, tentando sair dela a pé, sem saber como entrara, e encontrava sinais preocupantes de uma presença maligna.

Primeiro texto meu publicado após onze anos de afastamento da literatura, sua versão original saiu na coletânea «Solarium», da Editora Multifoco, em 2009, representando um momento importante na minha vida, por três razões. Foi a minha primeira obra publicada em onze anos, a minha primeira incursão no terror e o início de minha relação com a Editora Multifoco, que viria a publicar o meu primeiro romance, Praia do Sossego.

Sobre meu afastamento da literatura, isto será assunto para a minha autobiografia, se um dia quiserem que eu escreva uma. Sobre minha incursão no gênero terror, isto tem a ver com as minhas leituras de então: Lovecraft e Poe, principalmente. Além disso, eu estava envolvido com uma comunidade de literatura no Orkut e encontrava lá muita gente interessada no gênero: acabou sendo natural que eu me interessasse por ele na busca de leitores.

Foi ummomento marcante para mim, não apenas porque eu superei uma fase na qual eu me limitava a apenas blogar ocasionalmente coisas que escrevia, mas também porque foi a primeira vez que me disseram ter selecionado um texto meu para publicação. Não creio que eu mesmo teria selecionado aquela versão dOs Estranhos, mas gosto realmente é algo que não se discute: vários dos leitores da antologia Solarium lembraram do meu conto na hora de citar os melhores do livro.

De qualquer forma, nunca fiquei satisfeito com a maneira como conduzi a versão preliminar. Obcecado com a ideia de agradar a um público mais amplo, tentara incluir um núcleo romântico: dois casais em crise que acabam se “trocando.” Foi uma péssima ideia, segundo o que hoje penso, porque eu não dediquei à construção do relacionamento complicado dos quatro personagens toda a atenção que era necessária para dar credibilidade à mudança de parceria. Nem haveria espaço, em tão poucas páginas, para ser bem-sucedido nesta tarefa. Por isso esperei até esgotar-se a primeira tiragem da coletânea e pedi licença à editora para retrabalhar o texto e publicar uma versão revista e expandida. Qual não foi a minha surpresa ao descobrir que os termos do contrato não proíbem a republicação nestas condições, nem sequer para as coletâneas cujos contratos ainda estão na vigência (dois anos)!

Devidamente autorizado, fiz todas as modificações que gostaria, inclusive restaurando o argumento original da história, no qual a casa no alto do morro não era um refúgio proposital dos protagonistas, mas apenas um lugar aleatório, poupado da invasão dos Estranhos, e não havia nenhum relacionamento romântico conturbado. A versão aqui publicada é mais fiel aos dois pesadelos que me serviram de base e, apesar de mais longa, é mais enxuta e fácil de ler.

Se algum dia publicar este conto em livro, ele deverá formar uma obra única, sem qualquer divisão em partes. Só fiz diferente aqui no blog porque reconheço que meus leitores não teriam boa vontade em ler uma obra de sete mil palavras de um fôlego só.

Parte IParte IIParte III

20
Dez 11
publicado por José Geraldo, às 18:00link do post | comentar

A Montanha pontificava sobre o vale como um farol no mar de morros do interior de Minas Gerais. Inexplicavelmente os Estranhos não haviam se ocupado dela. Era lá que ficava o refúgio que abandonáramos, era lá que… «Mas, que merda é essa?»

A menos de duzentos metros de nós, uma das coisas voadoras veio pousar, com uma levez realmente Estranha e dobrando-se e estalando sobre si mesma como um origami diabólico. Por fim aquela forma surreal, reduzida a um mero pacote do que fora, caiu pelo chão como uma concha de lesma e foi rapidamente conduzida para dentro de um galpão por alguns seres vestidos com albornozes negros. O ciclo se fechava ali: eu havia presenciado tudo o que precisava para entender muita coisa que me intrigara desde o alto do morro, minha aventura louca fora recompensada.

O sol continuou subindo, estalando nas folhas ressequidas da grama de inverno e nos dando a impressão de que poderia sanear aquela pústula que se abatera sobre o mundo, mas essa esperança vaga começou a morrer quando me dei conta de que nenhum carro passara pelo asfalto desde dias antes, e nenhum passava naquele momento.

Continuamos andando em uma direção qualquer, para longe da cidade, seguindo o caminho de menos esforço. Antes de virarmos a curva seguinte, tive tempo ainda para olhar para trás e ver, sendo rolada para forma do mesmo galpão, outra daquelas dobraduras loucas, que logo adquiriu asas e decolou, para amaldiçoar com sua sombra o que um dia fora um belo vale, sede de uma cidadezinha razoável.

Logo adiante percebemos que não seria fácil chegar a algum lugar: os fios de luz cortados, postes telefônicos tombados, os radares da polícia rodoviária explodidos e estranhas listras escuras marcadas na face dos morros, listras onde o pasto morrera e se transformara em pó, onde as árvores pareciam desesperados carvões acenando para um vento inútil.

Um carro estava parado exatamente sobre a ponte, parecia ter sido queimado. De perto vimos que não era bem isso: ele estava inteiro por dentro e por fora, apenas sua pintura esfarelenta denunciava algum tipo de acelerada corrupção. Os pneus rachados haviam deixado escapar todo ar, e se desfaziam aos cavacos, como a borracha estivesse irremediavelmente leprosa. Ao volante, um esqueleto limpo, com os ossos ligeiramente alaranjados.

Madalena não me perguntou nada sobre o carro. Pobre coitada, imagino como se sentia. Eu mesmo não conseguia falar coisa nenhuma. Em mim, porém, brotou naquele momento a constatação da raride de restos mortais, humanos ou não, desde que penetráramos a cidade. Era muito pouco tempo desde o aparecimento dos estranhos, pouco mais de uma semana, deveria haver uma fedentina insuportável de corpos em decomposição, mas não havia nada. O que poderia haver de mais sinistro nesta constatação eu nem tentei imaginar. Apenas respirei fundo, sentindo-me sortudo por ter conseguido atravessar o vale das sombras da morte como se o Senhor fosse o meu pastor.

Continuamos andando, porém, como se a própria vida dependesse disso. Apesar do peito ofegante, do corpo suado de medo que esquentava à medida em que o sol subia, apesar da alma carregada de dúvidas e das pernas doendo da caminhada de já quase sete quilômetros, traçada entre tantas interrupções, com calma e pavor. Deviam ser seis da manhã, ou menos ainda. No verão o sol nasce muito cedo.

Olhei para Madalena com curiosidade. Ela estava fitando o caminho à frente, com teimosia de quem quer viver. Seu cabelo estava tão empapado de suor que se transformar numa túnica negra que caia sobre as suas costas. O desodorante vencera dias antes e um cheiro forte saía de seu corpo, mas um cheiro que não me repelia totalmente, um cheiro de deserto, de idade da pedra. Fosse outra circunstância eu teria me sentido excitado, mas diante dos fatos o meu cérebro desligou esta emoção. Procriar seria inútil se não achássemos segurança.

O riacho corria preguiçoso e o mundo andava tão silencioso que eu conseguia ouvir o barulhinho da água. O mau cheiro que ele exalara dias antes estava quase inteiramente dissipado. Esta constatação me encheu de esperança, e eu acabei dizendo que era bom estar vivo, afinal, pois o mundo parecia ter sobrevivido.

Passada a curva seguinte encontramos o primeiro automóvel intacto. Ou quase. Estava cuidosamente estacionado em uma entrada que dava para um matagal, ponto conhecido de meus anos loucos de juventude: quando não tinha dinheiro eu estacionava ali para transar. Uma listra negra cruzava o asfalto alguns metros antes, a primeira que pisaríamos em vários dias. Sobre ela estava o que parecia ser outro resto incendiado de automóvel. Mas aquele, escondido entre as folhas ainda vivas daquela moita de beira de estrada, não fora tocado por nenhum fogo divino.

— Parece que tem alguém lá dentro — observou Madalena, que, obviamente, estava enxergando melhor do que eu, pois tinha olhos naturalmente bons enquanto eu lutava contra a gordura acumulada em minhas lentes.

Tentei limpar os óculos no lenço já ensebado de suor, só piorando a situação. Lambi-os em desespero, melhorando um pouco sua transparência, mas criando um cheiro horroroso de mau hálito em torno de meu nariz. E enquanto isso Madalena e eu nos aproximamos cuidadosamente do veículo para ver quem estava dentro.

Era um casal de namorados, obviamente, mas ambos mortos. Hediondamente mortos por balaços através da cabeça.

— Morte matada — novamente Madalena se adiantava, deixando transparecer a leve influência de seu falar.

Nunca lhe perguntara de onde viera. Não se pode conversar muito com putas, ou se corre o risco de descobrir sua humanidade, ou talvez até de brotar uma paixão vexaminosa dessas. Mas aquela expressão, aquele jeito diferente de rolar as vogais, tudo me sugeria que ela vinha de longe, bem longe, ou estivera por lá durante muito tempo. Isso, porém, já não fazia sentido algum. Ainda existiria o «longe»?

Madalena tapava o nariz, contrariada pelo cheiro e pelas moscas nojentas que voejavam em torno dos cadáveres, que já começavam a sorrir, expostos que estavam à umidade e aos vermes.

— Enterramos esses pobres diabos? — perguntei.

— Pelo amor de Deus, não!

— Não é nada humano deixar dois cadáveres assim sem socorro.

— Não se preocupe com esses, não se importam mais. Eles tiveram foi sorte.

Tive de concordar. A única sorte maior que a de estar vivo era ter morrido. Não sabíamos qual era a terceira alternativa, mas nossa passagem por dentro da cidade sugeria que pudesse ser algo bem pior.

Deixamos aquele carro servir de esquife para os dois, apenas tendo o cuidado de usar a gasolina para atear-lhe fogo. Foi um funeral limpo e puro no alto daquela elevação de beira de estrada, coberta por um ralo matagal. As chamas subiram feias e misturadas com a negra mancha do hidrocarboneto, mas o cheiro daquela combustão purificava o ar da putrefação daquelas pobres vidas.

Uma série de estalos graves vindos da direção da cidade me despertou para o perigo. Agarrei Madalena pelo braço e nos atiramos barranco abaixo, através dos galhos e cipós. Caímos estatelados e arranhados à sombra de uma goiabeira e olhamos para cima, apavorados. Duas enormes e negras sombras voejavam em círculos sobre o incêndio, como urubus. Nunca vira os Estranhos tão de perto, nem mesmo em nosso encontro ao amanhecer, na saída da cidade.

Ele voejou e voejou, como se perscrutasse a cena, mas não pareceu nos ver. Talvez o calor forte da queima de tanta gasolina o inebriasse, ou ofuscasse. Lembrei-me da cena na escola e tive esperanças de escapar. Estas esperanças me fizeram congelar de novo, sem dizer palavra. Mas quando Madalena sentiu o vento movido pelo farfalhar abjeto daquelas asas inomináveis ela surtou e se levantou e saiu correndo e chorando em direção ao córrego.

O Estanho logo abandonou seu movimento circular em torno do carro em chamas e soltou um longo assobio que me estalou nos ouvidos e confundiu totalmente os meus sentidos. Senti grogue, tive vontade de vomitar. Voltei o rosto para o lado, preparado para isto, e vi Madalena tropeçar e cair.

No instante a seguir eu acordei em uma poça de vômito. Não havia nenhum Estranho voejando por perto. Levantei-me do chão tão rápido quanto consegui e olhei na direção onde Madalena caíra. Havia algo lá.

A custo movi o primeiro passo. Minhas pernas estavam pesadas, embora me obedecessem. Levantar-me fora relativamente fácil, mas ficar de pé não era. Minha cabeça estava estranhamente confusa e eu não sabia exatamente o que deveria fazer a seguir. Sentia-me como se tivesse estado fortemente sedado, mas só me lembrava daquele longo assobio. E lembrar dele me fez ter novamente vontade de vomitar.

O que estava caído no chão era mesmo Madalena. Ela respirava. Embora tivesse o rosto imerso no próprio vômito, não sufocava porque caíra com metade do rosto sobre o barranco do córrego. Levantei-a daquela posição vexaminosa e atirei na água, para purificá-la do que tivesse acontecido. Desci junto, lembrando da mancha esverdeada entre a minha cara e o peito.

Madalena acordou com água fria e me olhou, soluçando.

— Perdão, perdão, eu não aguentava mais.

— Não tem problema, Madalena, não foi nada.

Na verdade não tinha nenhuma noção do que poderia ter sido. Difícil asseverar que não fora nada.

Apontei-lhe uma casa ali perto, oculta entre as folhagens densas de árvores frutíferas:

— Devemos nos esconder, eles podem voltar.

— Ali não — ela disse. Aquele carrou chamou a atenção deles, não duvido que procurem aqui em volta. Nossa única chance é conseguirmos sair daqui.

E assim, trôpegos e enfraquecidos pelo efeito sonoro inesperado e pelo vômito que provocara, nos levantamos e seguimos o leito do rio, fracos demais para escalar o barranco até o asfalto. Mais abaixo a estrada e a vargem se encontravam em uma ponte, ali seria mais fácil buscar a estrada de novo e tentar achar mais gente, talvez um carro funcionando. Com sorte um carro cujo ocupante tivera a educação de não se matar sentado ao volante para enlamear com sua carne putrescente o estofamento. Talvez de lá conseguíssemos fugir para mais longe, talvez encontrar um lugar onde houvesse mais gente como nós, onde fosse possível cultivar uma simples horta e resistir vivendo, apesar do Inesperado. Seria difícil conseguir isso. A vargem não era nenhuma mesa de bilhar, e não havia árvores que nos servissem de esconderijo.

Enquanto arrastava Madelana comigo — ela estava bem mais enfraquecida — eu olhei para o céu e notei as nuvens negras que se formavam:

— Tomara que seja chuva.

— O que será que nos pega primeiro — perguntou Madalena, algo cínica — a chuva ou os Estranhos?

— Tomara que seja a chuva.

Atrás de nós, na distância, ouvíamos os tétricos estalos daquelas asas malditas. Ao mesmo tempo em que o ar carregado anunciava um aguaceiro de verão a caminho.

— Se tivermos sorte, Madalena, a chuva vai confundir os Estranhos, e nos dará a chance de escapar. Se não chover, querida, essa vargem transformada em pasto não esconde nem um sapo.

— De qualquer forma, com chuva ou sem, vamos andando.

E continuamos andando, torcendo para vir logo a chuva.


18
Dez 11
publicado por José Geraldo, às 11:00link do post | comentar

À medida em que nos aproximávamos da cidade, sentíamos o ar mais opressivo, mais parado, mais agônico no peito, como se uma mão forte pousasse sobre nossos corações, segurando o tórax em cada inspiração. O ar parecia partido em flocos, granulando nossa visão, ou seria apenas a ilusão que a penumbra traz aos olhos despreparados de quem, como nós, viveu uma vida inteira sob luzes artificiais?

Quando chegamos à primeira rua, pudemos ver a primeira alteração significativa da realidade: tudo parecia muito abandonado, como se as coisas novas não fizessem mais sentido. Como se o tempo estivesse avançando rápido, ou recuando, como se uma espécie de putrefação tivesse vindo com os Estranhos.

O primeiro edifício significativo por que passamos foi uma oficina mecânica. Vários veículos ali estavam abandonados, alguns com as entranhas extirpadas, como pacientes em meio a uma operação. Minha reação diante deles foi paradoxal: fiz-lhes um respeitoso aceno e balbuciei uma oração automática. Na ausência dos cadáveres de seus donos eu reverenciava aquelas máquinas, que podiam servir-lhes de cenotáfios.

Mais abaixo pela avenida chegávamos ao estranho monumento a que chamáramos de "Caldeirão da Bruxa" quando crianças. Normalmente uma rotatória movimentada, com todo tipo de veículo chegando e saindo da cidade por ali. Mas desde nossa entrada na cidade já esperávamos que estaria silencioso e calmo de podermos andar pelo meio da pista. Foi só um pouco mais adiante que começamos a ver sinais preocupantes de coisas que haviam realmente acontecido: ossadas, humanos, caídas pelo chão, incompletas, com sinais de justiça sumária. Aqui e ali fogueiras extintas. A brancura daqueles ossos, quase luminosa sob a rara luz de uma noite de lua nova, me fazia pensar em seres asquerosos que os teriam limpado de uma maneira horrível.

Porém, na avenida não parecia ser possível que ainda acontecesse violência alguma. Passamos diante de uma padaria saqueada, imaginei os ossos do padeiro caídos por detrás do balcão. Um avental azul ensanguentando me fez pensar na balconista vesga que tinha um namorado tatuado e sonhos de se tornar dentista fazendo uma faculdade que não teria nunca como pagar trabalhando ali. Uma pequena tragédia terminada, certamente, com a chegada deles.

Foi então que Madalena, falando com cuidado para que as palavras mal fossem audíveis, me fez perceber o que eu já pressentia, mas não aceitava:

— Não vamos achar nada útil nessa visita.

— A não ser o que pudermos aprender, não é?

— A morte não ensina nada a quem morre.

Não lhe respondi, continuei olhando à esquerda e à direita, tentando imaginar lugares de onde pudesse extrair suprimentos ou objetos úteis. Mas suspeitava que cada faca estivesse cega, que cada lanterna estivesse quebrada, que cada pilha estivesse sem carga.

Porque era incrível a rapidez com que a decrepitude se instalara. Havia erva crescendo sobre os prédios e casas, arrebentando por entre os paralelepípedos, as raízes das casas estavam crescidas medonhamente e sombras escuras corriam pelos cantos, de sombra a sombra.

— Ratos…

Não eram ainda nem nove da noite quando chegamos à praça ao pé do morro e miramos as árvores que ladeavam a Catedral.

— Ainda tem coragem? — perguntou-me Madalena.

Não lhe disse que sim nem que não. Estava ocupando percebendo como o mundo andava estranho. Amassando folhas de árvores para ver se estavam mais secas, pisando no chão com força para ver se não estava esfarelando sob meus pés.

— Ratos, morcegos, insetos…

— Também percebi — ela disse — que tudo que era cultivado está morrendo. Flores plantações, toda forma de cultura. Mas não é surpresa isso, não há ninguém mais cultivando.

— Só não quero que o dia nos surpreenda nessa cidade de pesadelo. Vamos logo ver o que viemos ver, e embora depois.

Subimos o Morro da Catedral mais cuidadosamente ainda. Com o resto da bateria da máquina fotográfica eu registrava tudo que pudesse ser interessante, mesmo sem saber se um dia encontraria fotógrafo onde revelar as imagens ou mesmo computador para descarregá-las. Também evitava vê-las pela tela para não gastar a bateria. Não me lembro quantos flashes foram: havia, de fato, muita coisa interessante para se fotografar. Mas Madalena me chamou à razão:

— Podem perceber-nos pelo flash.

Guardei a câmera em minha sacola, com muito pesar, e continuei trocando passos mecânicos e decidos pelos degraus da escadaria acima. Como se tivessem me hipnotizado.

Chegando à praça percebemos, então, que não estava deserta como o resto da cidade. Apesar de escura como uma cisterna, havia nela um contínuo movimento de sombras fúnebres, cada uma parecendo ter algo a fazer num maquinismo infernal. Dezenas ou centenas de Estranhos perambulavam como formigas, entrando e saindo das ruas laterais, carregando pequenas sacolas e caixas. Foi só então que percebi que eles, apesar de sua aparência diurna formidável, eram pequenos e tinham uma forma quase humana.

A imensa porta da Catedral estava escancarada, abria-se como uma boca monstruosa em direção à cidade, como se faminta por ela. De dentro vinham murmúrios e sopros que pareciam musicais. E pelas portas laterais entravam e saíam os Estranhos, leves sobre o chão, como se já não pertencessem a este mundo.

Tive medo de que pudessem ver-nos. Madalena me abraçou, já temendo o momento em que todos nos cercariam para um linchamento ou pior, mas logo até ela se acalmou: aquelas criaturas passavam por nós sem perceber-nos, pareciam passar até através de nossos corpos, cegas e insensíveis à nossa existência, pelo menos enquanto não dizíamos nada. Não, não tive a coragem de dizer coisa alguma, muito menos Madalena.

Ela me levou pela beira da praça até o muro do Colégio, onde nos escondemos na sombra para descansar, ainda sem coragem de dizer palavra alguma. Depois me arrastou até uma das janelas, cujo vidral se quebrara com alguma pedra ou violência parecida. Dentro estava uma algazarra de mantos, albornozes e vestidos. Faces idênticas, plácidas, pálidas, contritas em alguma forma de emoção incompreensível. Todos vestidos de cores escuras e misturadas, como se um acidente de tinturaria houvesse manchado de luto todas as cores floridas.

Mas os Estranhos eram, como eu pude então perceber, pelo menos parecidos com humanos. Talvez humanos até! Mas como?

Permancemos ali, olhando para eles por quase meia hora. Não havia sentido no que faziam, no que diziam. Aos poucos o medo de que nos vissem foi passando, substituído pela impressão de que não nos veriam nem se deixássemos uma bomba na Catedral. Por fim, enjoado daquilo, puxei Madalena pela mão e saímos da praça.

Descemos de novo pela longa escadaria e passamos em frente à Prefeitura, em cuja fachada, pendurada como um corte de carne no açougue, estava imóvel e úmida, sem oscilar um milímetro no ar parado da noite, uma rota e suja Bandeira Nacional. Saudei o sofrido Pavilhão Auriverde com saudades do que ele representara, mas o que ali estava era o cadáver de um ideal antigo.

Quando já nos sentíamos totalmente perdidos, vimos uma luz brilhar na escuridão. Era uma luz pequena e rútila, que mal conseguia se filtrar por cortinas escuras e gretas, uma luz presa num porão. Procuramos em torno do prédio até acharmos uma porta. Com certa facilidade Madalena a abriu usando alguma coisa que extraiu de sua cabeleira, demonstrando habilidades que eu não conhecia.

Entramos pisando com leveza, tentando não acordar nenhum espírito do local, mas foi uma precaução quase desnecessária diante do ruído incessante que perpassava os corredores daquele prédio. O local havia sido uma escola, conforme me lembrava vagamente. Longos corredores cheios de eco, ladeados de portas que se sucediam como as notas de uma flauta, terminando em uma sombra sinistra, onde nenhuma estava aberta, mas apenas gretas de luz filtravam por ao rés do chão. Em condições normais, teríamos medo. Mas a certeza da morte nos havia despido disso. Tínhamos apenas cuidado e curiosidade.

A porta da primeira sala estava aberta. A luz que víramos não era de nenhuma espécie de lâmpada ou artefato de intenção semelhante. Provinha do zumbido de uma complexa aparelhagem de vidro e metal, que era manipulada com uma vagareza terna por mãos pálidas e magras, que saíam de albornozes escuros.

Havia vários dos Estranhos naquela sala, cumprindo tarefas diversas, todas de alguma forma girando em torno do misterioso maquinismo. Todos estavam completamente cobertos pelas roupas negras, todos tinham pesadas máscaras cobrindo suas faces, como a proteger-se da toxicidade daquela luz que nos atraíra. Olhando melhor, tive a impressão de que a palidez daquelas mãos não era natural, era do material com que haviam feito luvas, também para guardar-se dos efeitos daquele aparelho.

Madalena me puxou pelo braço, sinalizando à frente. Obedeci sem perguntar. Quando tomei o primeiro passo, um dos Estranhos olhou exatamente em minha direção, como se alertado pelo meu movimento, ou por algum ruído meu, ou pela simples agitação do ar. Eu me plantei, apavorado, sem conseguir erguer o pé para continuar andando. Porém, a expressão no seu rosto, se possuía uma, ficava oculta por detrás de uma máscara negra e brilhante que obscenamente evocava traços humanóides, mas não exatamente humanos. Direcionei toda a minha vontade para congelar os meus músculos e impedir que eu fraquejasse. Naquele instante o juízo me voltou e eu percebi o quanto fora louco de buscar entrar no antro dos Estranhos. Maldita a minha curiosidade. Eu não temia pela minha vida, mas por algo muito pior que poderia acontecer.

Aos poucos, a fixidez da expressão do Estranho, isenta de qualquer menção a levantar-se ou a chamar algum dos outros, pelo menos de forma visível, me fez ver que ele não estava me vendo. Talvez estivesse ofuscado pelo excesso de luz que havia naquela sala, ou talvez fosse mesmo cego. Sei que me mantive ali imóvel, segurando a respiração devagar, torcendo para meu coração bater o mais baixo possível. Minhas pernas começaram a doer, mas aquele olhar gélido ainda me encarava, e eu o encarava de volta, como quem mergulha no abismo. «Maldito, está esperando acostumar-se à luz para poder me ver.»

Fui salvo pelo que, na hora, pensei ter sido um simples acaso feliz: a máquina, por alguma razão, pareceu desconcertar-se e começou a produzir fumaça e forte cheiro de ozônio penetrou o ar. Seguiu-se uma série de silvos baixos e ritmados, como sussurro muito apertados. O Estranho volveu os olhos para a aparelhagem que começava a piscar em muitas cores e eu aproveitei aquela nesga de instante para avançar os pés e chegar a Margarida, que estava paralisada na sombra providencial entre duas portas. Mas ela certamente sabia, tão bem quanto eu, que a sombra nada significava para os Estranhos. Foi a minha vez de puxá-la pelo braço. Arrastei-a pela porta de banheiro. Não sei o que foi que me levou à conclusão, que se mostrou correta, de que o banheiro não teria nenhuma serventia para eles.

Encostei a porta com muito cuidado e ficamos sozinhos na privacidade precária daquele banheiro escuro. Sem podermos sequer sonhar a possibilidade de acionar um interruptor de luz. Tateei pelas paredes de azulejos e levei-nos até uma das privadas, no canto oposto, suficientemente distantes da porta para podermos ofegar em paz relativa.

Nenhum de nós tinha coragem de falar. O medo retornara. Os Estranhos tinham deixado de ser figuras fantasmagóricas de crepom negro que voavam sobre o vale, ou fantasmas de pessoas partidas, ou aparições inexplicáveis. Haviam adquirido uma apavorante materialidade, uma maldade que era difícil negar. Uma maldade que não derivava de suas intenções desconhecidas, mas de sua mera e total Estranheza.

Após conseguirmos regular um pouco a força da respiração, tratamos de sair da arapuca em que nos metêramos. Subimos em um dos vasos e alcançamos a janela. Com dificuldade a abrimos, mais por não querermos fazer nenhum ruído do que por sua resistência. E então saímos para o jardim da escola, próximos ao muro.

Para saltar o muro não tivemos tanto cuidado, mas tivemos a sorte de a escada do zelador ainda estar funcional, apesar da grossa camada de ferrugem que a cobria. Pisamos de novo em liberdade, a horrível liberdade, no gramado fedorento das margens do córrego. Felizmente ele era estreito e pudemos saltar à outra margem, escalar o barranco até a rua e tomar o caminho mais rápido para fora daquele inferno de cidade.

Andávamos devagar, querendo muito evitar que nossos calçados fizessem ruído no chão. A partir daquele ponto percebemos que muitas das casas ainda eram «habitadas» — se é que os estranhos podem ser considerados habitantes de algum lugar. Em uma das casas, pudemos ver, pela janela escancarada, um grupo deles examinando um violino, torturando-o para que produzisse grunhidos horrendos, para aparente satisfação do grupo. Estavam tão absortos nisso que não nos notaram passando. Tinham por aquele pobre violino um interesse que me pareceu tão genuíno e humano que quase tive esperanças.

Havíamos chegado à parte mais plana do vale onde a cidade se erguera. Ali era uma antiga praça de comércio, transformada num apinhado estacionamento onde os automóveis pareciam caramujos abandonados por moluscos mortos. Passamos por eles sem reverência, buscando sair da cidade pelo caminho mais curto. Quando pisávamos o asfalto, enfim, olhamos para trás e vimos todo o vale negro, sem luz nenhuma que denunciasse o frêmito ininteligível dos Estranhos. Erguia-se um sol mortiço detrás da Montanha, filtrando raios magros através de nuvens lerdas e gordas que se amontoavam no horizonte. Atravessáramos a cidade, a pé e temerariamente, em uma única noite.


11
Dez 11
publicado por José Geraldo, às 22:32link do post | comentar

As silhuetas deles poluem agora a visão do horizonte. Há dias que têm estado assim: patrulhando o céu de uma forma quase apática, mas voejando pelo vale como ilhas de escuridão, rutilantes, intangíveis, deitando sombras sobre casas e árvores, fazendo-nos tremer por dentro como se soubéssemos de algo. Mas não sabemos de nada.

Apareceram do nada, sem que estivéssemos preparados para qualquer uma reação. Cortaram-nos uns dos outros, como peças de um tabuleiro cujas casas apareceram subitamente muradas. Estamos presos onde estamos, cada um dentro de onde estava quando tudo aconteceu. Apenas acenos nos contam de quem há nas outras casas, todos trancados e em silêncio, à espera de que a sombra passe e o sol brilhe de novo no jardim.

Devo dizer que nós, cá nesta casa, tivemos sorte. Por estranho que possa parecer estávamos no fim de uma festa, perto do amanhecer. Quando percebemos o acontecido, aqui ficamos, contemplando. Os estranhos nadando na límpida atmosfera da manhã, insondáveis, indiferentes, e todos aqui imersos na poeira e na fumaça de um fim de festa, cansados, sonados, de hálito pesado na boca e suor pregado na roupa.

Ficamos porque tínhamos medo, claro. Não vou inventar nenhuma estratégia, nenhuma razão psicológica ou curiosidade científica. Ninguém aqui é desse tipo. Éramos apenas clientes de um clube de strippers isolado na segurança de uma montanha, fora dos limites da cidade. Lugar privilegiado para contemplá-la, para antecipar quando a polícia vem. Cá estamos nós, alguns homens perdidos, algumas mulheres perdidas. E como o mesmo adjetivo é diferente em cada sexo!

Os Estranhos chegaram, como eu disse, de uma forma tão súbita que nem mesmo os notamos. Tentamos entender algum propósito, algum plano, mas eles não parecem possuir nenhum. Agem de uma forma quase vegetal, flutuam preguiçosamente, como poças de estagnação transformadas em balões, em silêncio, com uma lentidão que apavora.

Madalena chegou à janela na terceira manhã, pela primeira vez. Tinha sido das mais assustadas, mais cheia de culpas, mais supersticiosa. Agarrara-se com seus ícones de bolso e suas figurinhas de gesso e balbuciara tantas palavras que ficara rouca. Tinha medo de demônios e de anjos, de morrer cedo ou de viver "daquele jeito". Seu profundo medo a purificou, deu-lhe uma forma estranha de pudor, de dignidade. Limpou-se de toda pintura e escovou os dentes até remover deles todo resto ou gosto de pecado. Depois pendurou um crucifixo no peito, por fora de uma camiseta de malha escura, e andou entre nós, de cabelos soltos e desgrenhados, quase como uma sacerdotisa.

Mas dizia que ela chegou à janela naquela terceira manhã e observou longamente os espasmos dos Estranhos, ouviu indiferentemente os estalos da estática no rádio, como um espectro irritante de um além tão próximo. E naquele momento, de seu peito socado de tanto choro e vela, brotou uma conversa coerente, finalmente:

— Desta distância é quase impossível saber quantos são.

O senhor grisalho a quem ela se dirigiu não pareceu compreender, preocupado que estava em engolir o máximo do uísque barato, como se esperasse pela redenção de um coma alcoólico antes que o destino o rendesse. Mas eu estava perto, compreendi o esforço que ela fazia para romper o casulo do medo, e lhe recebi com palavras tranquilas:

— Também tenho dificuldade para contar. Às vezes a gente fica com a impressão de que parecem enxamear pelo mundo, outras vezes, que são só alguns que ficam se revezando aqui em volta. Não sei, o que eu sei é que eles parecem dominar os dias, e não há nada que eu saiba que a gente possa fazer.

Os olhos dela continuaram vidrados na paisagem, enquanto a boca falava com uma coerência típica dos traumatizados:

— Parecem grandes pedaços de cartolina, ou de feltro fosco, ou de camurça negra, não sei. Parecem bater asas, contorcer-se, como se estivessem vivos, quase os escuto estalando, como morcegos voando na escuridão do meio dia.

No momento em que ela o disse, também tive, pela primeira vez, a impressão de que ouvia um estalo. E mais ainda:

— Mesmo eles sendo tão completamente negros, dá para sentir, bem de vez em quando, um leve brilho negro, como se o sol os afetasse.

Madalena não me ouvia, ou não dava sinais de me ouvir.

— Parecem bailando no ar, tão inocentes, tão sem maldade, num ritmo lento e seguro, até bonito, como se nem pudessem voar.

Interrompeu-nos um ruído de cadeira caindo. Madalena acordou de seu transe místico e eu finalmente consegui parar de encarar seus olhos negros. O farmacêutico se enforcara. Amarrara o currião na trave da mão francesa e em torno do pescoço, depois chutara a cadeira em que subira, e seu largo corpo, flácido e pálido, saco de vícios e vaidades, estendeu o couro até quase os seus pés tocarem o chão. Havia uma curiosa ironia em ver aquilo: mais três ou quatro milímetros e ponta de seu sapato poderia tocar o chão, se ele quisesse ainda tocar o chão.

Tentamos ainda socorrê-lo, mas não havia o que fazer: os cento e sessenta quilos desajeitados do suicida não eram fáceis de carregar, não depois de dois dias sem uma refeição de verdade, não pelas duas únicas mulheres que estavam na sala, junto comigo, o velho bêbado e o bibliotecário cego — homens inválidos e putas cansadas, reduzidos à feminilidade da espera enquanto os másculos heróis se divertiam com baralho e boquetes no andar de cima. Quando finalmente desceram para ver o que era, os dois olhos do farmacêutico já estavam esbugalhados e a sua língua, roxa e roliça como uma berinjela, mal cabia em sua boca.

— Mas que merda! Esse pacote de banha tinha que se matar bem aqui na sala, no meio do bar! — berrou o Tenente Marcelo, ainda se achando um digno militar, apesar das calças mal abotoadas e do bafo grosso de álcool que espalhava no ar.

Com gestos rápidos ele determinou: cortaram o cinto e deixaram o amontoado humano se estender no chão, sobre a poça de urina e fezes líquidas que descera no momento final. Depois enrolaram o tapete e o levaram para fora. Mas como era dia e as sombras haviam se agitado temporariamente, não ousaram muito mais que abandonarem-no diante da casa, no gramado próximo à piscina que ninguém mais tinha coragem de usar.

A experiência pareceu afetar a todos, pelo menos temporariamente, mesmo os mais empedernidos, os que ainda esperavam, usando o resto de seu dinheiro para pagar por favores sexuais, mesmo as mais alienadas, que ainda se vendiam esperando ter algo a fazer com as joias e as notas de cem. Ninguém subiu para o segundo andar naquela tarde, em vez disso gastaram longos banhos, como se o corpo do pobre farmacêutico obeso lhes houvesse contaminado com algo incompreensível.

Madalena, que voltara à janela para contemplar os Estranhos, atraiu-me até lá. O senhor grisalho, ainda preocupado em beber até a inconsciência, retomara seu assento junto à parede e encarava a garrafa de Orloff como um desafio. Mergulhava a cereja em calda, como se para adoçar a própria morte, e sorvia goles curtos.

Os outros foram vindo, depois de seus banhos, e se instalando no saguão para beber. O assoalho de madeira estava ligeiramente mais claro no lugar onde se estendera o tapete, restando como sinal da morte que ali pousara. Do lado de fora, o cadáver jazia enrolado, próximo à piscina.

Os Estranhos pareciam comportar-se de uma forma ligeiramente diferente. Com movimentos ligeiramente mais rápidos, com uma tendência incômoda de fazerem círculos que pareciam aproximar-se da montanha, como se ela, de repente, lhes atraísse algum interesse. Como se eles já não tivessem a antiga inocência, a indiferença que notáramos. Não sei se fui o primeiro a perceber isso, mas o disse a Madalena:

— Tenho a impressão de que estão querendo ocupar o vale inteiro. Estão circulando mais longe, como urubus procurando carniça.

— Não tenho certeza se sabem da carniça — ela me interrompeu — mas é bem claro que estão circulando uma área mais larga. Dá para ver que estão mais longe uns dos outros.

Naquele momento um grupo, em estratégica fila, como uma esquadrilha decolando para a guerra, subiu do chão junto a um galpão distante, ao lado de uma soturna igreja aonde eu, funcionário burguês, ateu e forasteiro, nunca pusera os pés. Vê-los sair de lá me fez ver, talvez pela primeira vez, que eles eram menores do que pareciam quando voavam pelo céu, tão desfraldados e escuros.

Subiam do chão se desdobrando, se espalhando, jogando vestes imateriais em torno de algum vácuo igualmente ralo. E quando chegavam à altura das nuvens, já pareciam pipas monstruosas que tapavam o sol, sem que sequer uma gota perfurasse sua seda.

Enervado com a movimentação dos Estranhos, que parecia ter se tornado ameaçadora, procurei outras coisas para olhar, seres em que pensar. Mas apenas encontrava o tapete enrolado perto da piscina. Enquanto engolia em seco e criava coragem para sair da janela e buscar água morna para aliviar a garganta irritada, percebi que alguém mais notara o morto: um grande tatu, de pernas peludas e orelhas frenéticas, correu do mato até ele, sem temer nenhuma presença de humanos, como se soubesse já que nós não sairíamos da casa por nada desse mundo. E ao aproximar-se do pacote fúnebre que enfeitava o jardim do bordel, ele encostou o seu focinho na fibra antiga, ansioso como quem entra num banquete, e foi se enfiando pelo túnel de tecido adentro, produzindo movimentos asquerosos, repetitivos, mastigatórios.

Madalena fez uma careta de horror, imaginando o que poderia estar acontecendo ali, quando, então, um horror maior aconteceu: o tapete, deixado numa posição quase precária do jardim, perturbado pelo fossar do animal, começou a girar lentamente sobre si, ganhando velocidade no declive, cada vez mais velocidade, aproximando-se da grande ribanceira, desenrolando-se inominavelmente enquanto se movia, até que o corpo volumoso do farmacêutico apareceu sob o sol, e ainda instável, rolou pela montanha abaixo, para espanto e tristeza do tatu, que o olhou caindo como quem vê meio pão com manteiga caído da mesa com o lado cortado para baixo.

Os Estranhos ficaram ainda mais agitados. Naquele momento eles definitivamente pareceram perceber a casa. Mas, para nossa sorte, era já uma tarde velha, que se carcomia em noite.

— Madalena, eu vou embora.

— Para onde?

— Dentro de duas horas terá anoitecido, e eu não quero ver outro dia aqui dentro nem por nada nesse mundo. Vou pegar o carro e seguir para Juiz de Fora.

— O que você espera ver em Juiz de Fora?

— Não sei, mas não vou ficar aqui esperando a morte chegar, porque é o que vai chegar amanhã.

— Será que ainda existe Juiz de Fora?

— Não sei, pode ser que os Estranhos estejam somente aqui.

— Nesse caso, você tem certa razão em querer ir. Faz sentido querer avisar o mundo.

— Mas o mundo não precisa de aviso. O mundo já deve saber. Quando começou, quem tinha internet mandou o seu recado. Quem tinha telefone, telefonou. Quem pôde fugir, fugiu.

— Pensando bem, a linha telefônica tem estado muda desde que aconteceu. Não tem eletricidade, não tem nada no rádio.

— Sem eletricidade não tem como saber se ainda existe televisão, se a internet está no ar, se o até mundo ainda existe. Mas, principalmente, não dá para saber se é só aqui, ou se foi no mundo inteiro.

— Gostaria de ter um binóculo.

— Já não viu o bastante?

— Nesta vida  já vi tudo que não queria, mas ainda tem muita coisa que eu queria ver.

— Uma saída daqui, por exemplo?

— Não, o que são as manchas brancas lá embaixo no asfalto.

Saí de perto dela para buscar água. Só mesmo muita sede me força a beber água morna. Mas estendi minha saída até a garagem, lá fora. Uma temeridade. Por alguma razão eu deixara de ter medo dos Estranhos. Entrei em meu carro, abri o porta-luvas e retirei de lá a minha câmera fotográfica. Não era um binóculo, mas tinha uma teleobjetiva bastante poderosa. Suficiente para satisfazer Madalena, ela, que tinha fama de se satisfazer com substitutos do que a maioria das mulheres quer. Minha barriga estava tão cheia d'água que a sentia sacolejar quando andava. Com dificuldade a água morna se agarrava em meu estômago, só a força de vontade a impedia de subir.

— Não é um binóculo, mas deve alcançar uma imagem boa lá de baixo no asfalto, Madalena.

Ela tomou a câmera de minhas mãos, eu me aproximei de seu rosto, para ensiná-la a manipular os maquinismos analógicos daquele monstro fora de moda, do tipo que ainda funcionava com filmes. De tão perto o perfume dela não parecia tão vulgar, havia algo de doce nele, cheiro de xampu barato, de suor de puta, mas cheiro que convidava.

Aos poucos as lentes foram perfeitamente ajustadas à distância, e as manchas brancas se discerniram em ossos limpos, humanos. O sol brilhava neles, como em flores de margaridas em um prado verde, o gramado da minha escolinha de infância, coalhado de florezinhas brancas, o gramado onde, um dia, uma outra Madalena, negrinha e bonita, mais velha e mais sabida, me agarra pelo pé, me derrubara como um bezerro de rodeio, e me roubara vinte beijos, para depois sair andando, rindo, dizendo que os havia roubado e não devolveria nunca. Tinha sido um dia divertido quando eu chegara em casa, ainda chorando, traumatizado, dizendo ao meu pai que ela me havia roubado tantos beijos, e não os queria devolver. A risada de meu pai ecoou na minha lembrança. Aumentou a tristeza de ver aqueles ossos. Haveria ainda um dia para as crianças correrem livres sobre os prados?

— Madalena, não vou passar outra noite aqui. Vem comigo?

— Vou. Aonde?

— Quero ir ao centro da cidade, descobrir o que fazem os Estranhos durante a noite.

— É loucura.

— E é exatamente por isso que eu vou fazer. De que adiante ficar aqui em companhia de tanta gente mentalmente sã?

Ao dizer-lhe isso nos viramos para ver os outros homens, quase estuporados de tanto beber. As outras prostitutas se injetavam coisas inomináveis nas veias.

— Eu quase poderia ir agora. Não quero morrer aqui dentro como um passarinho abandonado na gaiola pelo dono. Não sei se Juiz de Fora existe ainda, por isso eu não vou lá, vou ao centro da cidade ver o que fazem à noite esses Estranhos. Acho uma resposta ou uma morte rápida, qualquer coisa é melhor que isso aí.

Madalena fez que sim.

— O que levamos?

— Uma moeda de ouro sob a língua seria uma boa ideia.

Mas levamos mais do que isso: banhados e vestidos com adequadas roupas negras, saímos da casa tão logo a primeira estrela veio. Logo notamos como o fundo do vale, onde a cidade se deitava, parecia tão mais escuro do que deveria. Era a falta absoluta da iluminação.

Descemos, em silêncio e bem devagar, a mesma encosta que o farmacêutico descera com tanto estrépito. Cadáveres adiados são mais lentos que os cumpridos para certas coisas. Era difícil tentar falar: o ar tinha um peso, um cheiro de medo que embriagava. Apesar disso, escolhemos o caminho mais rápido, mesmo sendo o mais devassado. À luz do dia, qualquer coisa que tivesse olhos nos veria descendo pela encosta do morro e seríamos ossos no dia seguinte, mas era noitinha e eu não tinha medo de olhos.


10
Dez 11
publicado por José Geraldo, às 18:40link do post | comentar

Se você acredita que alguém vai mandar vinte e cinco centavos para a família de uma criança com algum tipo de problema grave de saúde, parabéns, champz!, pode continuar compartilhando, mas eu não faço isso.

Primeiro porque a função do Facebook não é essa de ganhar centavinhos para famílias necessidades, segundo porque essa história é antiga e não passa de uma farsa criada por desocupados sem noção e só serve para poluir todo ambiente de convivência virtual.

Isso acaba funcionando porque a maioria das pessoas acha algo muito moralmente bonito dar um clique para "ajudar". Um clique não custa nada, não doi, e não envolve o «nojinho» de ficar perto de uma dessas pessoas. É como a história do "Mandarim" do Eça de Queirós. Aperte este botão e um rico mandarim morrerá na China e você receberá sua herança milionária. Apertar o botão é fácil, você não verá a morte do sujeito, não terá que conviver com as consequências da miséria de sua família. Então aperte-se o botão! No caso destas campanhas você não recebe uma herança milionária, mas uma consolação moral, a auto-satisfação de achar que está fazendo alguma coisa para ajudar alguém, mesmo que esta alguma coisa seja um mero clique, cujas consequências você não enxerga e não tem como controlar. É um tipo de fé: eu acredito que com esse clique eu salvei o menininho deformado, mesmo tendo me negado na semana passada a doar para a APAE ou para o Asilo da minha cidade. A salvação do distante me consola na minha convivência com o próximo necessitado.

Boa sorte a você que acha que de clique em clique vai salvando o mundo. Eu já desisti de argumentar com a fé cega das pessoas.


04
Dez 11
publicado por José Geraldo, às 21:56link do post | comentar

Um curto ensaio (de apenas 13 páginas) contendo uma série de ideias absolutamente desconexas, irrelevantes e ressentidas sobre porque considero Academias em geral como uma perda de tempo. Mas se você tiver a pachorra de ler talvez descubra que concorda comigo.

Introdução

Houve uma época, há não muitos séculos, em que o termo “academia” tinha um prestígio inabalável. Era, também, um tempo no qual as pessoas se sentiam muito identificadas com a monarquia, por razões as mais diversas, principalmente religiosas.1 Eram tempos brutos, nos quais a fogueira ou os instrumentos de tortura (quando não ambos) eram o destino de pessoas que não pensavam de acordo com a regra dominante. Eram tempos nos quais uma pessoa poderia passar a vida inteira em uma prisão para doentes mentais2 apenas por ter um comportamento ligeiramente divergente. A menos, é claro, que tivesse dinheiro e títulos de nobreza, nesse caso você poderia degolar mocinhas virgens para banhar-se em sangue na busca da eterna juventude durante décadas antes de alguém se incomodar em lhe condenar a uma “prisão domiciliar”.

Não quero, com isso, sugerir que acadêmicos são sanguinários, mas que a academia é um fóssil de uma época cujo fim, iniciado penosamente com a Revolução Francesa de 1789, é um dos grandes progressos da História. Este texto pretende explicar porque eu penso assim, e convencê-lo, leitor, a pensar de forma semelhante.

Origem do Termo

Para quem não sabe — e é possível que muita gente não saiba — a palavra “academia” remonta aos antigos gregos. Deriva do nome de um dos montes de Atenas, o Akademos, que, por sua vez, tinha sido transformado em um bosque sagrado, plantado em homenagem à deusa.3 Mas esta academia original era apenas o apelativo informal para o conjunto dos filósofos que se reuniam para discutir sophia à sombra de árvores célebres. Esta academia original seria algo inócuo, quase benigno.

Ocorre que esta palavra passou à posteridade como lembrança de nomes ilustres que por lá discutiram: Sócrates, Platão e Aristóteles entre eles, gigantes que deixaram indeléveis marcas na cultura humana por milênios a seguir. Era questão de tempo que alguém, interessado em comparar-se com S.P.&A. tivesse a brilhante ideia de chamar ao seu grupo local de discussões pelo mesmo nome antigo, mesmo que não houvesse o envolvimento de nenhum bosque, nenhuma deusa e nenhuma sophia.

É sintomático que o uso do termo tenha sido reconsiderado, quase um milênio depois que o zelo cristão dispersou a academia original, por um tirano florentino, legítimo representante dos ilustres regimes renascentistas italianos que, vistos por nossos olhos democráticos, seria o equivalente a um Muammar Kadhafi, um Benito Mussolini ou um ditador de republiqueta latinoamericana: militar, cruel e obcecado pelo poder. O que diferenciava os tiranetes florentinos dos ditadores do século XX era uma preocupação com a cultura: afinal, vivia-se numa época em que ser culto era chique, ao contrário de hoje, em que uma frase como “nemli e nemlerey” se torna um meme nas redes sociais. Nada era mais chique para um tiranete renascentista do que ter seu grego domesticado ensinando filosofia para a juventude. Algo assim como os milionários chineses devem sentir com seus ingleses de estimação ensinando língua e modos ocidentais aos estudantes: os náufragos de uma grande civilização decaída servindo de semente para a grande civilização nascente, ainda chamada de bárbara.

Academias e Absolutismo

Se a motivação original dos tiranetes florentinos ao criar “academias” fora dar um lustro de cultura nas suas armaduras sujas do sangue dos cidadãos,4 da vez seguinte que a ideia entrou em uso a preocupação com a cultura era menor, mas havia uma necessidade maior de definir a coisa. Muito depois que fossem esquecidas as academias renascentistas, com seus característicos nomes engraçados,5 os monarcas europeus se apropriaram da ideia. As primeira academias formais surgiram onde os monarcas asseguraram o poder absoluto ou onde os tiranetes conseguiram estabilizar-se no poder. Contrariamente às academias informais, com seus nomes tolos, estas tinham nomes pomposos e oficialescos.

Em Florença, Médici fundaram a Academia das Belas Artes de Florença, responsável, entre outras coisas, por hoje ainda chamarmos as artes visuais de “Belas Artes” e não simplesmente de “Artes Visuais”. Esta academia pretendeu (e conseguiu) substituir as inúmeras guildas de artistas e artesãos herdadas da noite dos tempos e unificar o ensino de pintura, escultura e outras artes ditas “belas”. Desta “unificação” surgiu um estilo padronizado, logo chamado de “acadêmico”, e cuja grande contribuição à história da arte pode ser medida pelo fato de ele ter surgido já no fim do Renascimento, ou de o fim do Renascimento ter já começado tão logo ele surgiu. A academia florentina teve uma acolhida tão boa (não necessariamente entre os artistas e artesãos anteriormente estabelecidos em Florença) que logo outros tiranos italianos (entre eles o Papa) trataram de criar suas academias. Pipocaram instituições semelhantes por toda a Bota: em Bolonha, em Siena, em Roma, em Nápoles. E com a difusão de tanta academia, o velho Renascimento começou a transformar-se em outra coisa, que hoje é chamada, retrospectivamente, de “barroco”.6

A Função da Academia no Contexto Absolutista

Obviamente os reis não fundavam academias apenas porque precisavam de um “ar culto”. A partir da segunda metade do século XVI a situação política já tinha mudado tanto que os reis não mais precisavam de subterfúgios. Mesmo os condottieri italianos haviam adquirido um ar de nobreza, que inicialmente não tinham, e podiam contar com legiões de imitadores e puxa-sacos. Confortavelmente sentados nos seus tronos, ao menos em comparação com a precariedade do poder de seus antecessores e antepassados, esses líderes puderam estabelecer estruturas para exercício de seu poder.

E as academias surgem nesse contexto: a função principal delas passou a ser, desde então, a de controlar a produção e a difusão do que se convencionou a chamar de “cultura”. Em suma: uma Academia é apenas um nome pomposo para os departamentos de censura dos estados absolutistas europeus. Senão, vejamos:

Uma das funções da academia era justamente a de centralizar a educação artística. A Academia de Belas Artes de Florença foi criada justamente para substituir todas as guildas de artistas e artesãos da cidade, colocando a formação dos futuros artistas integralmente sob a égide dos Médici, tiranos hereditários da cidade a ponto de se “enobrecerem”. Ein Volk, Ein Reich, Ein Akademie. Isto se consolidou com o surgimento das chamadas “Academias Nacionais”, das quais a Académie Française foi o modelo.

Outra importante função era manter a tal da “tradição”. O ensino de artes nas academias era baseado na cópia dos modelos antigos e o aluno só estava autorizado a desenhar suas próprias ideias depois de atingir certo grau de perfeccionismo na imitação dos mestres do passado, altura na qual já tinham, provavelmente, substituído suas ideias originais pelos ideais infundidos pela academia.

Por fim, uma academia também funcionava como instrumento para controlar quem estava autorizado a “fazer arte”. Sem um diploma da academia o sujeito não era considerado um artista formado e o seu trabalho ficava relegado a uma segunda categoria: ganhava menos, era menos prestigiado e não tinha nenhuma proteção se, de repente, alguém resolvesse se ofender com o conteúdo. Em Portugal, no fim do século XVIII, ser membro de uma academia, a Arcádia Lusitana, adiou consideravelmente a perseguição ao poeta Manuel Maria Barbosa du Bocage, cujo sobrenome passou à História como sinônimo de palavrão.

Da conjunção destes três objetivos, resultava que a Academia desestimulava a originalidade, propiciava a estagnação e dificultava o acesso do povo em geral à arte. Ao mesmo tempo, era um instrumento eficaz de neutralização da arte como um catalisador do sentimento nacional: os governos criavam academias justamente pensando em utilizar os nomes dos grandes artistas para legitimar o regime. Com o tempo a condição de “acadêmico” passou a ser praticamente sinônima de alguém comprometido com o sistema, ou por ele cooptado.

No caso específico da literatura, a academia sempre pretendeu estabelecer um padrão linguístico de prestígio, não apenas opondo-se a inovações linguísticas mas também procurando deliberadamente arcaizar o idioma, como aconteceu com a língua portuguesa, que, sob a influência do academicismo, progressivamente adotou um sistema ortográfico etimológico que llevouse mais de dous seculos para revogarse, a pesar de toda a difficuldade que offerecia aos estudantes, com innumeras lettras dobradas, digraphos inexplicaveis, e variantes orthographicas esdrúxulas.7

O Ataque Modernista ao Academicismo

Entre nós existe um marco definido de reação ao academicismo: a Semana de Arte Moderna de 1922. Em outros países o marco é menos definitivo e a transição foi mais lenta. Para nós fica parecendo que, da noite para o dia, alguns jovens iluminados resolveram atacar o status quo, criando do nada uma nova arte, livre das amarras do famigerado academicismo. A verdade é menos romântica, os ataques vinham sendo arquitetados desde a Revolução Francesa e àquela altura, na maior parte do mundo, o quo já não tinha mais nenhum status, como diria Millôr Fernandes.

A reação ao academicismo se deu, inicialmente, pela criação de academias rivais, como a Academia Prussiana, que se impôs a tarefa de fazer a independência cultural da Prússia em relação ao Sacro Império Romano-Germânico, mas com o tempo começou-se a perceber que o ideal nacional da Academia era diligentemente contrário às culturas minoritárias, o que era particularmente grave nos estados multiculturais, como a Espanha, a Áustria-Hungria e o Reino Unido. Na Espanha, por exemplo, o academicismo redundou em obscurantismo e em fascismo, chegando alguns acadêmicos a endossarem a supressão de todas as culturas não-castelhanas do país, ainda que tivessem, como no caso do catalão e do galego, uma tradição mais antiga e venerável que a do próprio castelhano e que se reflete até mesmo na confusão entre “castelhano” (a língua do Reino de Castela) e “espanhol” (que seria a língua do reino unificado da Espanha, que incluía Castela, Aragão, Leão, Astúrias, Galícia e Navarra).

O que aconteceu, de fato, foi que, no Brasil, tal como por vezes anteriores, o ingresso na modernidade somente ocorreu depois de esgotadas todas as demais popularidades. Somente entramos no Romantismo a partir da décade de 1830, meio século depois de países como Inglaterra e Alemanha o inventarem. Somente abolimos inteiramente a escravidão em 1889, e depois de nós só faltaram os países muçulmanos (tal como nós, muito a contragosto) e as colônias europeias na África (incluindo o notável exemplo sul-africano). Da mesma forma, somente contestamos o academicismo mais de sessenta anos depois do surgimento das primeiras correntes artísticas francesas (impressionismo, pontilhismo, simbolismo).

Pior ainda: escolhemos aderir ao modernismo justamente a reboque de sua versão mais degenerada, o futurismo italiano. Ninguém estranhe haver tantos sobrenomes assim entre os modernistas de 22: Del Picchia, Malfatti, Bo Bardi etc. Não que o futurismo italiano fosse artisticamente nulo, mas nós tivéramos sessenta anos de ideais artísticos antecipadores do modernismo, tínhamos que pular no barco justamente com os futuristas, adoradores do fascismo. Faz pensar que não houve, de fato, revolução alguma em 1922 (tanto que Del Picchia acabou eleito para a Academia Brasileira de Letras, em 1943, enquanto outros modernistas de muito melhor quilate, mas não ligados ao futurismo ou à Semana de Arte Moderna, como Drummond e Quintana, jamais puseram os pés naquela Casa).

A Continuidade como Característica dos Movimentos Políticos e Culturais Brasileiros

Nada do que foi escrito, dito, feito, pintado ou esculpido a partir de 1922 conseguiu efetivamente mudar a relação de poder no cenário cultural brasileiro. Algumas coisas mudam apenas para que possa tudo continuar igual, como na célebre frase de Malaparte. Os modernistas fizeram e aconteceram, mas foram sendo encampados pelo academicismo à medida em que foram ficando velhinhos e os velhinhos de 1922, ofendidos então, foram morrendo.

Você pode achar que estou sendo excessivamente cruel com os modernistas de 1922 (os quais, confesso, nunca exatamente admirei, por razões que somente muito tardiamente eu consegui articular), mas pare um pouco e pense sobre o contexto em que tudo aconteceu: será mesmo que foi da noite para o dia que um grupo de intrépidos jovens paulistanos sacou do bolso a ideia mirabolante de demolir o academicismo e forjar uma arte genuinamente nacional? Dificilmente, ainda que alguns livros de História possam dizer isso. Sabemos, e sabemos muito bem, que todos os eventos históricos são produto de tensões acumuladas, de condições preexistentes, de enganos e acertos de seus atores. Imaginar que a Semana de 1922 tenha sido uma súbita ruptura é algo ingênuo demais, até para mim que sou tão ingênuo.

Uma característica da História do Brasil é que, até hoje, não houve em momento algum qualquer revolta contra o status quo que fosse ao mesmo tempo inequívoca e vencedora. As vitórias obtidas são o produto apenas de movimentos toleráveis, e estes assim se tornam pelo recuo em seus ideais, pela cooptação do status quo ou então por se tornarem “póstumos” às mudanças que deveriam causar. Vê-se isso de uma forma muito evidente na maneira como certas mudanças culturais aconteceram no país.

A independência brasileira, por exemplo, não aconteceu como consequência de nenhum dos vários processos de ruptura que foram tentados, entre os quais dois de respeitável inspiração (as Conjurações de Minas Gerais e Bahia), teve que esperar até que as elites brasileiras cooptassem o processo, mais para livrar-se do entrave de uma metrópole que se mostrara frágil demais até para extorquir os impostos da colônia.

Da mesma forma, a superação da hegemonia portuguesa na cultura só ocorreu de forma gradual. Na educação, as faculdades nacionais foram sendo criadas devagar, provavelmente para não se por a perder o prestígio dos diplomas de Coimbra ostentados pela elite brasileira. Na literatura, o modelo acadêmico herdado de Portugal (e que lá já se encontrava superado) só foi encontrar contestação a partir da década de 1830, quando um honorável político (mas sofrível poeta) chamado Domingos José Gonçalves de Magalhães8 resolveu beijar a viúva e decretar o nascimento de uma nova literatura.

A tendência nacional era a de sermos mais conservadores do que os portugueses em quase tudo. Enquanto eles já abraçavam o romantismo na década de 1820 e os ingleses e alemães já o brandiam desde antes de 1810, nós só fomos fazê-lo a partir de 1836. Enquanto os portugueses já superavam a hedionda ortografia etimológica em 1910, nós ainda nos mantivemos aferrados a ela até 1946. É verdade que a República Portuguesa se inspirou grandemente na brasileira, inclusive na escolha da efígie que a representou na moeda e nos selos, e que nada mais era que a mesma Marianne dos franceses. Porém, quando no Brasil um homem como Olavo Bilac ainda detinha notável influência e o realismo-parnasianismo tinha força suficiente para sufocar todo um movimento literário renovador (o simbolismo), fazendo-o dissover-se numa mistura acéfala de estilos, transicional entre o antigo e o novo, e que entre nós foi chamada de “pré-modernismo” (fenômeno único na literatura mundial), enquanto isso Portugal já estava nas “dores do parto” da modernidade e a década de 1910 já via surgir as primeiras revistas modernistas.

A Semana de 1922 como um Movimento Reacionário de Direita

O que estou querendo dizer aqui é que 1922 não foi ruptura alguma: o parnasianismo caiu de podre, tanto quanto o classicismo caíra em 1836. Nada tendo de relevante a acrescentar,9 o parnasianismo se contentava em sufocar o que poderia surgir como novidade, tornando-se uma influência nefasta sobre nossa cultura.10 Sobre os ombros de seus próceres, inclusive Olavo Bilac, repousa responsabilidade indireta pelas mortes prematuras de Augusto dos Anjos (“não se perde grande coisa”, disse Bilac celebremente) e Lima Barreto (acometido de depressão no fim da vida), por exemplo, e pelas dificuldades enfrentadas por Monteiro Lobato, até ser vingado pelos modernistas, a quem ele, de forma paradoxal, tanto criticou. Desta forma, quando a Semana de 1922 aconteceu, dificilmente uma pessoa não comprometida com o status quo cultural poderia ver nela uma ruptura súbita. Vozes se antecipavam a essa ruptura desde pelo menos 1909, mas eram caladas pela atuação e pelo prestígio de cadáveres literários insepultos, como Raimundo Correia e Olavo Bilac. Em 1922 estas vozes encontraram patrocínio entre as elites paulistas, que tinham suas razões (até políticas) para se insurgirem contra o Rio de Janeiro, sua Academia e sua pretensão de hegemonia.

A Semana de 1922 aconteceu com pelo menos sessenta de atraso, se você quiser que ela tenha sido revolucionária. Aconteceu com pelo menos dez anos de atraso, se você quiser que ela tenha sido contemporânea aos fatos relevantes da literatura internacional. Mas aconteceu bem a tempo de aderir justamente ao futurismo, a forma radical e extremista de estética literária, originária da Itália, principalmente, que ansiava e celebrava o Fascismo. A Semana aconteceu no mesmo ano da Marcha Sobre Roma (ainda que sete meses antes), sintonizando-se com o momento em que Mussolini, já então político relevante e carismático, conseguiu acumular influência suficiente para chegar ao poder. E entre os grandes nomes de 1922 você não deixará de encontrar vários sobrenomes italianos, como os de Menotti del Picchia, Anita Malfatti, Victor Brecheret e Di Cavalcanti. É verdade que já havia alguns movimentos e eventos não acadêmicos desde 1916, e Manuel Bandeira já estreara o verso livre em 1919, no seu Carnaval, mas nada disso era motivo de escândalo: mais uma vez a mudança se fazia gradualmente, e com atraso. A Semana pretendeu romper, chutar o balde, abrir uma clareira na mata fechada do obscurantismo. Mas conseguiu?

Em primeiro lugar precisamos pensar em quem estava nessa vanguarda, inspirada grandemente em futurismo. Alguns dos mais significativos nomes de nossa literatura modernista notavelmente não estavam, ainda que apenas por causa de sua tuberculose. Mas Graça Aranha lá estava. Monteiro Lobato, uma das personalidades mais importantes da cultura brasileira pós-parnasiana não aderiu, mas o acadêmico Graça Aranha estava lá. Sem a bênção de um acadêmico, e as portas franqueadas do Theatro Municipal, a Semana não teria existido, ou não teria atingido seu objetivo. Portanto, analisando o contexto, percebe-se claramente que ela foi um de artistas integrantes da elite econômica emergente, de um estado economicamente emergente (que pretendia tomar do Rio a hegemonia cultural) e não necessariamente à revelia da Academia, embora tenha havido alguma animosidade entre os mais radicais de ambas as partes e certas mudanças (como a da orthographia) tivessem de esperar até morrer a maior parte dos fundadores da ABL (o mais resistente deles durou até 1963).

A Academia Como Instrumento Político da Direita

A Semana de 1922 ficou longe de ser a lápide da influência classicista no Brasil, em parte graças à inacreditável sobrevivência do academicismo no imaginário popular, através de um “pós-parnasianismo”11 encontrado na produção de poetas populares, muitos de orientação mística-católica. Mas marcou definitivamente o início de uma “troca de guarda” na literatura nacional, concluída por dois fatos relevantes: a eleição de Getúlio Vargas em 1941, marcando definitivamente a politização fascista da Casa, e a adoção da Reforma Ortográfica, sacramentada pelo modestamente intitulado “Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa”, através do qual a Academia, já então abrigando nomes notáveis do Modernismo, como Menotti del Picchia e Manuel Bandeira, consolidou sua ascendência sobre a língua nacional.

E assim, “nas calhas de roda”, seguiu girando, “a entreter a razão”, essa estrutura conservadora (por princípio e por definição), que se pinta, qual camaleão, com as cores sucessivas do progresso, de forma a sobreviver, mantendo-se relevante. Eleger membro o próprio presidente da República foi uma jogada de mestre, que infelizmente se revelou temerária com a redemocratização. Mas não faltaram nas décadas seguintes provas de fidelidade da Academia aos seus objetivos originais e aos seus verdadeiros patrões: os donos do poder.

Esta é a única conclusão a que se pode chegar, quando analisamos que vários políticos da direita. Como o próprio Vargas, e posteriormente Aurélio de Lyra Tavares (quão conveniente eleger um general de exército recém-saído da Junta Militar!). Como José Sarney e Marco Maciel. Mas não procure nela qualquer nome que em qualquer momento tenha sido de esquerda, flertado com movimentos populares ou mesmo simplesmente se oposto de alguma forma (qualquer forma) ao status quo.

A Academia tem entre seus princípios abrigar apenas escritores:

O estatuto da Academia Brasileira de Letras estabelece que para alguém candidatar-se é preciso ser brasileiro nato e ter publicado, em qualquer gênero da literatura, obras de reconhecido mérito ou, fora desses gêneros, livros de valor literário.

Mas isto não impede que ela tenha tido ou tenha em seus quadros um cineasta que jamais escreveu um livro (Nélson Pereira dos Santos), um político que somente escreveu discursos (Marco Maciel), um político autor de obras universalmente tidas como horríveis (José Sarney), um cirurgião plástico que somente publicou obras de cunho técnico (Ivo Pitanguy), um ditador fascistóide que não escrevia livros (Getúlio Vargas), um jornalista que somente escreveu sozinho um livro e um prestidigitador literário que sequer tem o domínio pleno da norma culta (não nomeados por aconselhamento jurídico). Uma análise mais profunda revelará vários nomes irrelevantes em seus quadros. Porém, conhece-se mais o caráter de uma instituição sabendo quem nela nunca esteve. Por isso, em vez de enumerar aqueles que em minha opinião lá não mereciam estar, prefiro enumerar aqueles que, na opinião da Academia, lá não mereceram figurar. E deixo ao leitor o julgamento:

  • Carlos Drummond de Andrade
  • Mário Quintana
  • Vinícius de Moraes
  • Adélia Prado
  • Rubem Braga
  • Paulo Mendes Campos
  • Mário de Andrade
  • João Simões Lopes Neto
  • Monteiro Lobato
  • Júlio César de Mello e Souza (Malba Tahan)
  • Lúcia Machado de Almeida
  • Fernando Sabino
  • Pedro Bloch
  • Murilo Rubião
  • Caio Prado Júnior
  • Gilberto Freyre
  • Florestan Fernandes
  • Maria Clara Machado
  • Oswald de Andrade
  • Bruno Tolentino
  • Cecília Meirelles
  • Henriqueta Lisboa
  • Murilo Mendes
  • Clarice Lispector
  • Graciliano Ramos
  • Lúcio Cardoso
  • Roberto Drummond
  • Pedro Nava
  • Wilson Martins

Não considero que todos eles são contestadores do sistema, mas tenho absoluta certeza de que qualquer dos citados estaria acima, literariamente falando, de um grande número de nomes que foram eleitos para a ABL. Considero, por exemplo, um acinte que a Academia não tenha nunca eleito Graciliano, um dos maiores prosadores da língua portuguesa, mas tenha aceito (sem sequer ter escrito livros) o presidente da república que o mandou prender e torturar (Getúlio Vargas, ditador fascistóide e nome de praça ou avenida em quase toda cidade do Brasil).

No Fim das Contas

Todos estes tortuosos raciocínios objetivavam concluir que, no seu todo, a Academia é uma instituição não apenas conservadora (na maior parte do tempo) mas retrógrada (algumas vezes). Que se caracteriza por manter a influência de grandes escritores depois que eles a perderam no contexto real da literatura, tornando-os guardiões de alguma coisa a que chamam de tradição literária, mas que, na maioria das vezes, confere tal posição a escritores medíocres e até a não escritores — e não por falta de opções, porque, não custa lembrar, Getúlio entrou no lugar de Graciliano, o que seria mais ou menos como indenizar o perpetrador do crime e condenar a vítima.

Muitos escritores sonham com a legitimação que ela pode conferir, em parte porque ela ainda detém certo poder e prestígio, mas se tal legitimação um dia acontecer com a minha obra, terei o dissabor de passar o resto de meus dias meditando se, de fato, a obra que sonhei fazer contestadora se revelou reacionária ou se, em algum momento, transitei da esquerda para a direita sem perceber.

Porque não acredito que a Academia transite na direção contrária.

1 Aprendi, a duras penas, que não se deve mencionar religião em um artigo a não ser quando religião for o tema principal deste, pois fanáticos idiotas sempre aparecem para desvirtuar a discussão com pregações ou ameaças de inferno. Mas, como esse blog é um espaço pessoal meu, reservo-me ao direito de somente aceitar comentários que se atenham ao assunto. Portanto, se você for terrivelmente ofendido por algo que eu diga, sugiro que faça um artigo em seu próprio blog (de preferência com um link para cá…) e direcione para lá toda a diatribe.

2 Ainda que com desculpas nobres, era isso, na prática, o que se fazia com quem era tachado de louco: botar a ferros e esperar que Deus matasse, de doença ou de idade.

3 Troféu “joinha” para quem perguntou “que deusa?”.

4Além da atratividade de ter um grego de plantão, que era o equivalente renascentista a ter um personal assistant.

5 Uma breve lista de nomes de academias surgidas nesta época: Academia dos Intrusos, Academia dos Vinhateiros, Academia da Virtude, Academia dos Intrépidos, Academia dos Iluminados, Academia dos Animados, Academia das Noites Vaticanas, Academia dos Ordenados, Academia dos Fantásticos, Academia dos Imóveis, Academia dos Diabos, Academia dos Aborígines, Academia dos Infecundos, Academia dos Ocultos, Academia dos Incultos e Academia dos Revoltados.

6 Se algum dia você tiver acesso a uma máquina do tempo e retornar à Europa entre a segunda metade do século XVI e a primeira metade do século XVIII, jamais questione os artistas (e seus patrões) quanto ao que tinham como “fato”: a continuidade do renascimento. Não importava a mudança da orientação, de humanismo para misticismo, de sobriedade para ornamentação, de substância para forma, de leveza para riqueza etc. Duvidar do caráter renascentista do mais barroco dos barrocos era como não chamar de “Revolução” o nosso putsch se você voltasse a 1967 e estivesse diante de um milico.

7 Não pretendo que este breve trecho esteja correto segundo a ortografia etimológica, pré-1910, apenas escrevi desta forma para dar uma ideia geral de como teríamos que escrever se as academias nunca tivessem sido desafiadas.

8 Talvez por não conseguir nenhuma crítica favorável aos seus poemas de inspiração classicista.

9 É fato notável que todas as obras literárias relevantes produzidas no Brasil entre a virada do século e a Semana de Arte Moderna tenham sido produzidas exatamente por aqueles que o academicismo realista-parnasiano mais combatia: os simbolistas (“decadentes”, “loucos”) e os pré-modernos. Homens como Lima Barreto, Augusto dos Anjos, Cruz e Sousa e Pedro Kilkerry poderiam ter dado uma contribuição muito maior à cultura nacional se não tivessem enfrentado em vida a pilha de preconceitos de classe e de cor que se somava ao preconceito linguístico e cultural da academia, que via com desconfiança sua literatura espontânea e sintonizada com o povo.

10Boa parte da culpa pelos trinta e seis anos de atraso que o Brasil levou, com grande prejuízo de nossa educação, para aderir à reforma ortográfica deve ser atribuída à forte influência da Academia, que contava com nomes como Olavo Bilac (m. 1918), Alberto de Oliveira (m. 1937), Afonso “Porque me Ufano de meu País” Celso (m. 1938), Carlos de Laet (m. 1925), Luís Murat (m. 1920), Filinto de Almeida (m. 1945), Carlos de Azeredo (m. 1963) e Clóvis Bevilacqua (m. 1944).

11Na verdade o termo “neo-parnasianismo” (que não é de uso corrente ou frequente em crítica literária) é mais usado para a segunda geração modernista, que buscou recuperar o apuro formal, ou mais propriamente usado para os autores da segunda geração realista-parnasiana (atuantes nas primeiras duas décadas do século XX), por isso aqui preferi o termo “pós-parnasianos”, no sentido dos praticantes tardios desta escola literária, numa época em que ela perdera a hegemonia. No caso destes autores, a permanência de tal influência reflete, geralmente, um atraso em relação às mudanças sociais e culturais pelas quais o Brasil passava.


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