Em um mundo eternamente provisório, efêmeras letras elétricas nas telas de dispositivos eletrônicos.
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Ago 11
publicado por José Geraldo, às 19:11link do post | comentar
Esta tem sido a semana em que os meus amigos blogueiros andaram escrevendo coisas que eu mesmo queria ter escrito. Isto pode ser um sério indício de que eu devo escrever mais, ou de que estou perdendo a mão. Mas não perco a esportiva e enfio outra louvação a uma postagem alheia, desta vez do José Abrão.

Não conheço José Abrão pessoalmente. Sei que ele se intitula um “estudante de classe média, goiano do pé rachado e fã de rock'n'roll. Aspirante a jornalista e futuro escritor best-seller”. Ele também é o autor de um blog que leva o fofucho título de “Vida besta e ordinária”. Apesar de sua tendência a gastar caracteres demais escrevendo sobre histórias em quadrinhos de super herois, o cara é bom no que faz e ocasionalmente nos brinda com textos de fazer arregalar o olho. Foi o caso esta semana. O texto em questão se chama Achados e Perdidos e foi publicado no dia sete, mas só o li hoje.

Se o Ronaldo Brito Roque já havia atiçado o meu lado de auto-ajuda ao escrever seu irônico texto intitulado O Melhor, o Pior e o Médio; José completou avassaladoramente o serviço com o seu curioso conto sobre o misterioso aparecimento de corações em um sisudo escritório. A história é muito menos sofisticada no terreno da imagística e Zé Abrão é menos hábil com a língua portuguesa do que o “macaco velho” do Ronaldo Roque, mas ele tem mais talento para narrar com agilidade e dá ao seu texto uma certa indignação que é mais parecida com o meu próprio estilo, além de ser também mais convincente de sua própria visão de mundo. Por isso eu digo que, se em ambos os casos eu gostaria de ter escrito estes textos, eu tenho a impressão mais forte de que poderia ter escrito o texto do Zé Abrão. Não devido a qualquer comparação de “qualidade” (conceito que eu considero bastante fluido quando se fala de arte), mas devido à convergência de estilos que há entre a prosa deste mineiro calçado de botinas e bebedor de cachaça e os causos urbanos do goiano de pé rachado e fã de rock'n'roll. Nós que vivemos imersos no interior temos um linguajar que nos aproxima através dos planaltos e morros, e de certa forma Goiânia está mais perto de mim do que o Rio de Janeiro.

As pessoas que apreciarem o conto eletrizante sobre os corações psicodélicos do Zé Abrão, talvez encontrem pontos de contato em uma série de contos niilistas que eu escrevi entre 2009 e 2010 e que contém, entre outros, A Pilastra (uma história sobre uma artista frustrada que enfrenta a falta de poesia em sua vida), O Salário da Perseverança (que também é, a exemplo de Achados e Perdidos, um texto sobre a desumanização das pessoas através do trabalho), O Pecado da Tristeza (que é sobre depressão e a exigência de ser feliz em um mundo despreparado para lidar com a melancolia) e Uma Foto Infeliz (também sobre a desumanização das pessoas através do trabalho, só que desta vez visto sob o ângulo do conflito entre a vida pessoal e a profissional). Especialmente o segundo e o último são quase irmãos do conto do Zé Abrão.

Por outro lado, os que apreciarem o biscoito fino da prosa delicada do Ronaldo Roque, especialmente a sua verve satírica, talvez achem motivo para gostar de Multiplicai-vos e Crescei ou de Chega de Anjos, ou ainda de Fausto de Souza. O primeiro é uma crítica falida à falida moral burguesa. Certamente é um texto datado, mas a data é recente. Leiam-no enquanto o tema ainda não está vencido. Os outros dois são mais experimentais e talvez tenham um prazo de validade mais equivalente ao leite de caixinha do que ao “barriga-mole”. Chega de Anjos puxa um distante fio machadiano, acrescenta fartas doses de vodca e cachaça, depois dá um banho e faz tomar mingau de fubá com couve. Inicialmente fora concebido como uma brincadeira que certo dono de comunidades do Orkut tinha em usar referências angelicais nos títulos de suas obras inacabadas, mas hoje disso nada restou. Fausto de Souza, por sua vez, é uma versão modernizada (e mineirizada) da célebre história concebida por algum escritor famoso do século XVIII que este ignorante aqui não sabe quem é e está com preguiça de ir pesquisar na Wikipédia.

E assim eu termino o meu post de quinta-feira, elogiando dois caras que merecem elogios e tirando uma casquinha para ressuscitar bons textos meus que vocês que me leem talvez nem conheçam porque esses ficam escondidos nas brumas do passado. Se ao menos o blogger tivesse um jeito de apresentar uma lista das páginas por categoria!


Não sei se o Zé Abrão viu isso (http://www.malvados.com.br/index1522.html).
José Geraldo Gouvêa a 20 de Agosto de 2011 às 10:50

aham, vi sim, foi daí que tive a ideia. O niilismo portátil do André Dahmer às vezes tem umas sacadas fantásticas! Muito obrigado pelos elogios e por sugerir o conto do Ronaldo Roque, gostei muito!
Zé Abrão a 20 de Agosto de 2011 às 11:12

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