A história da Internet pode ser descrita em três fases: a fase do texto puro, a fase das “fontes básicas” e uma nova fase que está para começar.
Na fase do texto puro, que vem dos primórdios até o surgimento da linguagem HTML (“linguagem de marcação de hipertexto”) não existiam propriamente “páginas” a se visitar, mas arquivos de texto para você baixar. Esse tipo de Internet, a era dos BBS e do CompuServe, entre outras coisas, ficou tão para trás que hoje mesmo quem a viveu tem dificuldade para explicar como era. Era uma fase em que se usava navegar em FTP ou Gopher (um protocolo moribundo e outro recentemente abandonado) e a interatividade era mínima: o bacana era encontrar um arquivo de texto, especialmente um que contivesse informações “proibidas”. A internet era a pirataria da informação!
Um exemplo desta fase, que ainda pode ser achado por aí nos últimos sites FTP importantes, é o famoso “methods file”, surgido em um fórum de discussão dos antigos BBS chamado alt.suicide.holiday. Neste fórum se discutia basicamente sobre suicídio, e o arquivo em questão é uma peça surrealista que explica onde, como e quando se suicidar. Os diferentes métodos são analisados segundo sua eficácia, a dor envolvida e a disponibilidade. Alguns métodos são claramente humorísticos, outros são reais. Os ingredientes e suas doses são reais: você realmente pode se matar seguindo as instruções, mas ao ler as descrições dos resultados e a análise das consequências em caso de falha você dificilmente vai querer tentar.
A segunda fase da Internet começou quando Tim Berns-Lee e outros inventaram o HTML, o que permitiu o surgimento das páginas e dos sítios (conjuntos de páginas). Nesta época surgiu a possibilidade de formatação do texto (cores, alinhamentos, tamanhos de fontes, efeitos especiais, imagens, tabelas, tudo que você quisesse imaginar). Infelizmente, a formatação ainda dependia da disponibilidade de fontes no computador do usuário que estivessem de acordo com as fontes pretendidas pelo autor da página. Como isso raramente acontecia, ninguém se preocupava em especificar as fontes, isso era problema do navegador, ou das preferências do usuário.
Mas então a Microsoft doou para uso geral as famosas “fontes básicas da Internet”, que se tornaram rapidamente muito populares. Com isso os desenvolvedores de aplicações na rede passaram a especificar fontes para seus sites. Já não era preciso deixar a escolha para o navegador que o usuário estivesse empregando: era possível dizer, por exemplo, que determinado texto seria em determinada fonte, esperando razoavelmente que esta fonte estivesse disponível no computador do usuário. Um pouco mais tarde, com a popularização das folhas de estilo (“Cascading Style Sheets”), foi possível assegurar que em mais de 99% dos casos um sítio se pareceria como o autor pretendia: bastava usar os conjuntos de fontes semelhantes (“font stacks”). Entre esses, os mais populares sempre foram “Helvetica, Geneva, Arial, sans-serif” ou “'Times Roman', 'Times New Roman', Times, serif”. Recentemente fontes menos convencionais começaram a ser usadas, como Georgia, Lucida Grande, etc. A fonte Verdana, devido à sua grande popularidade se tornou a preferida de nove em dez sítios. É a fonte padrão do Orkut, por exemplo.
Mas havia um problema: as fontes disponíveis eram poucas. Na verdade, o programa de fontes para a Internet da Microsoft só incluía onze — Andale Mono, Arial, Arial Black, Comic Sans MS, Courier New, Georgia, Impact, Times New Roman, Trebuchet, Verdana e Webdings (Webdings) — das quais somente seis (Arial, Courier New, Georgia, Times New Roman, Trebuchet e Verdana) eram famílias completas. Além destas, o sistema operacional Windows ainda incluía uma série de fontes que não estavam disponíveis para baixar do sítio da Microsoft: Book Antiqua, Bookman Old Style, Haettenschweiler e Tahoma. Estas também logo se tornaram populares, especialmente a última.</fonf>
Combinando as fontes mais encontradas do Windows com outras fontes semelhantes, comuns em outros sistemas operacionais (como as fontes URW, comuns no Linux) era possível ter boa dose de previsibilidade na aparência final. Mas isso ainda era muito pouco, porque as fontes mais comumente disponíveis eram conservadoras demais. Com pouco tempo todo mundo já estava enjoado de ver tudo escrito em Verdana.
Estar enjoado causava estranhos sintomas em algumas pessoas. Por exemplo, há quem use extensivamente a fonte Verdana, tamanho 14 ou que use Comic Sans até para convites de formatura ou anúncios de funerárias.
Agora estamos começando a terceira fase da Web: já é possível especificar exatamente qual fonte o usuário verá na tela. Este meu humilde blog é um exemplo da aplicação desta nova tecnologia. Se você me está visitando usando Opera ou Firefox (ou algum outro navegador que entenda os padrões W3C), você está vendo este texto formatado na fonte “Neuton”, de Brian Zick.
Não tenho ainda muita condição de falar sobre o impacto que isso vai ter, mas suponho que no futuro a Web se tornará um lugar muito mais interessante de se visitar.
Aguardemos.