Em um mundo eternamente provisório, efêmeras letras elétricas nas telas de dispositivos eletrônicos.
30
Jul 11
publicado por José Geraldo, às 00:30link do post | comentar

Para autores, em sete lições

  1. Não os escreva.
  2. Se porventura acabar escrevendo algum, jogue-o fora.
  3. Se por razões pessoais não conseguir jogá-lo fora, esconda-o.
  4. Se tiver de publicar, não faça de seus amigos os seus fregueses. Amizade e negócios não combinam.
  5. Se vender a amigos e eles elogiarem, não peça detalhes. Evite a decepção de descobrir que estão elogiando porque são amigos, mas nem leram.
  6. Somente se pedir detalhes (oh, ousadia!) e eles disserem coisas que fazem sentido, suspeite que o livro seja mesmo bom.
  7. Nesse caso, chore os que jogou fora.

Para leitores, em dez lições.

  1. Leia a sinopse. Se a sinopse já é um ruim, imagine o livro.
  2. Não ligue para o prefácio. Prefácios são escritos por amigos, ou por alguém pago para isso.
  3. Desconfie dos livros que têm longas introduções e apêndices, a menos que o nome do autor seja John Ronald Reuel Tolkien. Se precisam de muita explicação, é porque não conseguem explicar-se por si mesmos.
  4. Antes de ler um livro de setecentas páginas escrito por um desconhecido, escreva aquele livrinho de cem páginas que ele também escreveu. Quem escreve mal um livro de cem páginas, dificilmente se sairá melhor num outro mais longo.
  5. Evite livros que tentam atingir vários públicos ao mesmo tempo. Imagine um automóvel ao mesmo tempo econômico, compacto, fora-de-estrada, familiar, de luxo e esportivo.
  6. Desconfie de livros ambientados em lugares inventados: é um truque fácil para esconder a preguiça de pesquisar sobre lugares reais ou a falta de vivência real do autor.
  7. Quando o autor diz ostensivamente que o livro é resultado de anos de trabalho, ele está implorando que você goste.
  8. Desconfie de apelos emocionais (livros que falam de algum lugar pobre, da guerra que está na moda ou de lugares recentemente focados pela “caridade” internacional.
  9. Fuja de livros que têm muitos erros de ortografia. Se a editora não corrige o que é mais fácil de detectar, então esqueça revisão estilística, aconselhamento editorial ou uma política de seleção focada na qualidade.
  10. Nenhum livro de auto-ajuda presta. Eu disse “nenhum”. Isto inclui este em que você está pensando e também aquele que mudou a sua vida, e também aquele que todo mundo leu. Se acha que presta, talvez seja hora de variar suas leituras. Quem só come arroz provavelmente não imagina o gosto que feijão tem.

01
Mai 11
publicado por José Geraldo, às 00:55link do post | comentar | ver comentários (1)

Entre os vários gêneros literários que me atraem existem três que são particularmente de minha preferência: ficção científica, ficção histórica e realismo fantástico. São, porém, três gêneros que eu pouco ouso praticar, devido às inúmeras dificuldades envolvidas em cada um deles.

Na ficção científica existe o problema da imaginação: é necessário ser um bom futurólogo, para que sua obra de hoje não se torne um futuro do pretérito dentro de poucos anos, ou logo após a publicação. E futurologia se faz com informação, não com bola de cristal. A maioria dos autores brasileiros de “ficção científica” se evade da responsabilidade de conciliar criatividade e ciência tomando o atalho dos gêneros híbridos, como a ficção “steampunk”, que intencionalmente localiza em um “futuro do pretérito” a sua ação, preferindo imaginar como o passado poderia ter sido do que especular sobre como o futuro poderá vir a ser. Uma ficção científica que funciona como fábula ou conto de fadas, ambientado a ação há muito tempo atrás, em uma galáxia muito, muito distante também funciona como boa saída para a necessidade de coesão e coerência.

Não há nada de errado em escrever ficção desta forma, embora eu, do alto de minha arbitrária opinião, considere que esses gêneros não são ficção científica “de verdade”. Inclusive foram muitas as obras geniais escritas de forma tangente à ficção científica. O que está errado é, ao meu ver, que haja no Brasil tão poucos autores tentando fazer ficção científica no duro.

Não se pode exigir de um país que ele tenha muitos Asimovs ou Clarkes, especialmente um país que tem esse sistema educacional digno de Praga do Egito, mas seria magnífico ver mais gente tentando, em vez de cair no terreno fácil da fanfic de Guerra nas Estrelas.

O realismo fantástico, por sua vez, é um tema extremamente incompreendido pelos Brasileiros, que o consideram algo fabulístico ou até alienado, quando ele possui uma carga de tragédia e de denúncia muito forte. Além do mais, por ser um gênero “supostamente” oriundo da América hispânica, enfrenta certa rejeição entre nós, que ainda os vemos como “outros”. Digo “supostamente” porque não se pode chamar de outra coisa que não “realismo fantástico” as obras de autores como Franz Kafka, Mikhail Bulgakov e Karel Capek — e eles escreveram na primeira metade do século XX, época na qual García Márquez, o definidor do tema, ainda nem era adulto.

Por fim, a ficção histórica merece um tratamento especialíssimo, pois, ao contrário de todos os demais assuntos literários, é um dos poucos definidos pelo seu rigor: eu não posso simplesmente ambientar uma obra no Egito sem respeitar o que se sabe daquele país, ou estaria fazendo uma fantasia exótica que nunca passará de pseudo-histórica. Para merecer o rótulo de “histórica” a ficção precisa ser coerente com o conhecimento existente, precisa fazer o leitor gritar “ahá” quando ele estiver lendo um compêndio histórico e lembrar do livro.

Boa ficção histórica é mais rara que água no deserto: a maioria dos autores apenas rotula que sua obra se passa na Espanha Renascentista, nos Estados Unidos do século XIX ou no Japão Medieval e recorre a algumas tinturas ralas retiradas de enciclopédias (as “cartilhas de alfabetização” em conhecimentos gerais). Na prática, produzem histórias ambientadas em uma espécie de “Terra de Marlboro”, que só existe nas idealizações de quem a concebe. O resultado são duelos de espada segundo rituais que só existiriam na França pós-revolucionária, caubóis bebendo uísque e atirando com Colts e gueixas que vivem só para apaixonar-se pelo primeiro samurai. A ação de tais histórias se baseia quase unicamente naquilo que está no imaginário coletivo, e não no realmente acontecido. De forma que o leitor de tais obras, se um dia estudar a história de tais lugares, se sentirá decepcionado por descobrir que não havia duelos ritualizados na Espanha do Século de Ouro, que a arma mais usada no faroeste era a espingarda e que as gueixas não eram mais particularmente “sofridas” e nem “apaixonadas” que a média das mulheres japonesas.

Não estou dizendo estas coisas para denegrir estes gêneros. Somente uma falha na interpretação do texto levará alguém a pensar isso. Muito, muito pelo contrário. São três gêneros que respeito muitíssimo exatamente porque vejo neles um grau de dificuldade que considero quase invencível. Tenho a certeza quase absoluta de que jamais conseguirei produzir, em qualquer destes três gêneros, uma obra de padrão internacional. Mas morrerei tentando, claro. Eu miro na Lua, porque é melhor falhar em algo grande do que em algo pequeno— Para você ter uma ideia, eu tenho exatamente uma obra parada em cada um desses gêneros, e não vejo como desatar.

A obra de ficção científica é um romance chamado “Epifania”, que possui entre seus temas inteligência artificial, colonização planetária, equação do apocalipse, psicologia de massas etc. Escrevi um primeiro capítulo e postei aqui, mas estou há meses tentando desenvolver a narrativa e não consigo, porque antevejo o tamanho da pesquisa que terei que fazer sobre todos esses temas. Parte da pesquisa eu até já fiz, consultando um astrônomo e um químico a respeito de localização estelas e natureza da composição do planeta, mas são tantas coisas a considerar ! Meia-vida de radiação, probabilidades de colapso das civilizações (Equação de Drake), conflitos e traumas psicológicos causados pelo confinamento, efeitos da baixa gravidade sobre o corpo humano etc. Me dá até arrependimento de ter começado.

Dentro do terreno do realismo fantástico eu escrevi um conto chamado “Fausto de Souza” e outro chamado “O Flautista” que, obviamente, não está pronto, mas cujas arestas eu não consigo terminar de aparar. O primeiro desviou da intenção e praticamente virou um texto humorístico. O segundo me parece irremediavelmente empoçado.

Na ficção histórica, porém, o caso ainda é mais grave. Eu tenho um conto longo, com mais de 30 mil caracteres, todo pronto, mas não ouso publicar porque, na afã da inspiração, eu o escrevi diretamente a partir de minha memória dos tempos de faculdade (sou licenciado em História). Depois que terminei, descobri vários buracos no assunto que precisam ser sanados para que ele tenha credibilidade. Eu pretendo ambientar o conto na Zona da Mata Mineira no século XIX. Não me interessa qualquer outra solução, pois tudo se torna sem sentido se isso for mudado. Inclusive as conexões que este conto tem e terá com outros contos meus. Mas eu fico retido porque não consigo saber exatamente que tipo de força policial haveria no estado de Minas Gerais no século XIX, e se tal força atuaria da forma como a descrevi. Suponho que não, mas isso simplesmente invalidaria todo o romance. Veja que maçada!

Esses três gêneros têm em comum, portanto, a exigência: são para quem não tem medo de estudar e aprecia uma narrativa rigorosa. Estas obras são “biscoito fino” que só agrada a um fino paladar. Não pensemos que venderão centenas de milhares de exemplares num passe de mágica.

Mesmo assim, não existe, para mim, maior prova de valor literário do que fazer o que se faz nesses três gêneros: combinar a liberdade do criador, a célebre “licença poética”, com a fidelidade à realidade, produzindo obras que ficam entre a ficção e a historiografia. Admiro imensamente quem é bem sucedido nesta tarefa, e almejo muito conseguir atingir a maturidade nesses assuntos.


23
Abr 11
publicado por José Geraldo, às 13:47link do post | comentar | ver comentários (1)

Vocês que acompanham este blog devem ter notado que iniciei um projeto de tradução do romance “The House on the Borderland”, a que intitulei “A Casa no Fim do Mundo” (o título significaria, literalmente, “A Casa Sobre a Fronteira”, mas isto faria pouco sentido para o leitor, razão porque preferi mudar). Como a obra é desconhecida no Brasil (apesar de ter sido escrita no início do século XX e até já estar, inclusive, em domínio público), alguns podem estar perguntando o que motivou a minha decisão de traduzi-la — e qual a relevância literária de um tal trabalho. Este artigo pretende responder, ao menos em parte, este tipo de questionamento.

Antes de mais nada devo dizer que não devemos nos limitar unicamente a fazer aquilo que é grande e que é relevante. Não devemos ler somente o que é clássico, nem devemos ouvir apenas a música que faz mais sucesso atualmente. É na diversidade que se acha o prazer da vida, como diz um sábio ditado: o que seria do azul se todos gostassem do amarelo. Minha decisão de traduzir a obra de William Hope Hodgson; ainda inédita em português, pelo que me consta; motiva-se principalmente pelo desejo de trazer o autor ao conhecimento de um público maior. Seria tolice minha afirmar que Hodgson é um clássico esquecido ou um gênio incompreendido da literatura: não tenho gabarito para tais afirmações. O que afirmo é que se trata de um autor que vale a pena ler, mas que quase ninguém no Brasil já leu, pelo simples fato de não ter acesso à sua obra em nossa língua. Traduzindo-a, permitirei que mais pessoas a conheçam e possam achar motivos próprios para gostar dela.

Um segundo motivo importante é a relevância deste autor para um gênero literário que está em voga atualmente: a literatura “fantástica” (aqui um rótulo abrangente para incluir ficção científica, fantasia, terror, mitologia, ficção histórica e outros temas que se cruzam facilmente na obra de seus maiores expoentes). Hodgson foi um pioneiro do gênero que hoje é chamado de “new weird”, que consiste em justamente empregar com liberdade os temas acima mencionados, e outros inclusive. Há cem anos, este inglês (aparentado com irlandeses) mesclava reencarnação, piratas do Caribe, cosmologia, histórias de marinheiro, romances platônicos, literatura gótica, lendas célticas, arquétipos mitológicos, teorias de psicologia e outras coisas, resultando em um universo caótico e rico.

Hodgson foi autor de uma obra extensa, caracterizada pela virilidade e autoconfiança de seus personagens, que no entanto não são sempre meros homens de ação. De sua obra, dois romances saltam à vista, pela grande qualidade de sua concepção e por estarem intimamente relacionados pelo tema: “A Terra Noturna” (The Night Land) e “A Casa no Fim do Mundo” (The House on the Borderland). Embora, à uma primeira vista, ambos sejam muito diferente (quanto à linguagem e à construção dos personagens, principalmente), os dois se complementares no aspecto da cosmogonia envolvida: uma cosmogonia pessimista que reflete muito o estado de espírito dos homens da Belle Époque.

“A Casa no Fim do Mundo” narra a história de um nobre irlandês, o nome nunca é dito, que se isola em uma antiga e estranha mansão, no extremo oeste do país, o chamado Gaeltacht — a região onde todo mundo falava (pelo menos na época em que a história se passa) apenas a língua irlandesa céltica. A casa, ele comprara por um preço irrisório, devido à fama de mal-assombrada, que lhe havia deixado sem morador por quase um século.

Nesta casa encontramos o narrador, cuja história nos chega através do “manuscrito” achado pelos senhores Tonnison e Berreggnog (uma estranha dupla de ingleses que, sabe-se lá por que motivo, resolveu acampar bem no meio do nada, em uma região da Irlanda cujo povo nem sabia inglês). Ele está diante de um mistério: a aparição de misteriosas criaturas de aparência suína, que passaram a atacá-lo desde que teve um transe que durara um dia inteiro, durante o qual obteve um vislumbre do universo. Acompanhamos este irlandês sem nome, que ali vive sozinho com uma irmã mais velha, chamada somente de “Mary”, enquanto enfrenta os tais caras de porco. Depois o seguimos em suas explorações do terreno, juntamente com ele fazemos interessantes descobertas sobre sua casa até, por fim, mergulharmos com ele em um gigantesco pesadelo cósmico que vai além de tudo quanto podemos imaginar e cujas consequências fogem não apenas às leis básicas da ciência, como vão até contra os princípios mais comuns da lógica narrativa. Tão poderosa e estranha é a narrativa da segunda parte do romance, cujo tom quase psicodélico deixa o leitor quase todo o tempo “sem chão”, que não são poucos os leitores que a rejeitam, não são poucos os que dizem que o romance “teria sido melhor” caso tivesse somente a primeira parte.

Gosto é gosto, uma afirmação tautológica até inútil, mas é verdade que sem a segunda parte “A Casa no Fim do Mundo” mereceria menos atenção, seria apenas uma história de horror bem material, sobre um esquisitão recluso enfrentando porcos espertos (ou algo assim). Certamente menos interessante do que o redemoinho de ideias a que a segunda parte tenta nos levar. Mas é justamente nesse redemoinho que está a parte que mais interessa a respeito de Hodgson: ali está sua singular concepção de um universo fantástico que mescla cosmologia clássica (pré-relativística) com elementos da mitologia grega, teorias de reencarnação, engenharia militar, ideais esportivos (fisiculturismo) e ideologia nacionalista. Uma senhora barafunda, que resulta em um universo fantástico original, muito diferente do padrão tolkieniano de elfos, dragões, feiticeiros e frágeis civilizações perdidas ambientadas numa idade média imaginária. Apenas para atiçar a curiosidade dos leitores, a inspiração de Hodgson não é um passado decadente, mas um futuro inevitável.

Hodgson não é um autor habilidoso com as palavras. Sua narrativa nunca soa redonda, devido à frequência irritante com que repete expressões e palavras, devido à pouca variedade da sintaxe e asperezas diversas. Os seus defeitos ainda foram exacerbados por sua tentativa de ir além dos limites de sua cultura, imitando canhestramente a linguagem de autores barrocos e neoclássicos sem ter vocabulário ou conhecimento filológico para isso. Tais defeitos são bem menos pronunciados em “A Casa no Fim do Mundo”, que está vazada numa linguagem mais chã e quase estudantil, mas prejudicam de modo terrível o seu melhor e mais relevante romance, “Terra Noturna”, a ponto de muitos críticos recomendarem que capítulos inteiros sejam saltados durante a leitura, ou que seja lido em versões resumidas. No entanto, uma tradução cuidadosa, enxugando um pouco dos defeitos da prosa de um autor que pouco interagia com a crítica ou com outros autores, revela a força imaginativa de um homem à frente de seu tempo em uma variedade de aspectos, que, porém, ainda assim, de outras maneiras, era preso a convenções e ideais do passado, como a castidade pré-nupcial, o romance cortês, os valores cavalheirescos e a força de uma religiosidade heterodoxa (Hodgson era espiritualista) que parecia, naquela era de fascínio pela ciência, uma sombra do medievo a repousar sobre seu caráter.

E tal tradução nos permitirá apreciar, em Hodgson, um gênero literário que estava ainda em sua infância, uma época em que ainda não havia se fixado na repetitividade que o caracterizou depois.


Uma lista de conceitos que fazem parte do universo ficcional de William Hope Hodgson

  • Ameaça Alienígena
  • Amor cortês
  • Arcologia
  • Armas misteriosas
  • Deuses Astronautas
  • Energias místicas
  • Fisiculturismo
  • Perigosos Trópicos
  • Poder das Pirâmides
  • Portais Dimensionais
  • Reencarnação
  • Romantismo da Pirataria
  • Terra Oca
  • Valores cavalheirescos
  • Viagem no Tempo
  • Virtude da Virgindade

Se você se interessou, saiba que a tradução terminou e estou preparando já o e-book. Confira os detalhes aqui.


08
Jan 11
publicado por José Geraldo, às 16:37link do post | comentar | ver comentários (1)

É direito de todo mundo gostar dos clássicos e também de detestá-los, desde que você tenha um critério. Detestar os clássicos "em bloco" é ignorância. Mas gostar de um e não de outro é algo perfeitamente natural.

Não pretendo desenvolver nenhuma tese de doutorado sobre um paradigma universal de valoração da qualidade intrínseca dos textos literários, apenas disse que ninguém é obrigado a gostar dos clássicos só porque são clássicos, da mesma forma como ninguém é obrigado a gostar dos best-sellers porque vendem muito. Ambas as posições são falaciosas: Achar que todos somos obrigados a gostar dos clássicos é argumentum ad verecundiam e achar que somos obrigados a gostar dos best-sellers é argumentum ad populum (apelo ao gosto popular).

Inclusive porque o conceito do clássico pode variar ao longo do tempo. Obras que um dia foram consideradas de alto padrão hoje estão praticamente esquecidas, enquanto autores que um dia foram ignorados hoje são revalorizados e redescobertos. Nem todos os clássicos são iguais, nem em fama, nem em qualidade, nem em influência e nem em capacidade de agradar a múltiplos gostos. Obrigar-se a gostar dos clássicos é abdicar do direito de ter uma opinião própria, é aceitar a imposição totalitária de um cânone decidido pelos “capazes”. Mas ainda pior do que isso, é abdicar de tentar desenvolver o gosto literário através da comparação.

Você tem todo o direito de não gostar de algum clássico, só não tem o direito de ser ignorante deles. Não há salvação na ignorância.


19
Dez 10
publicado por José Geraldo, às 17:04link do post | comentar

A literatura de ficção e fantasia que conhecemos descende do exotismo escapista da Europa entre o final do século XVIII e o início do século XX. A grande repressão dos costumes, o caráter ainda muito embrionário da democracia e a difusão de múltiplas e contraditórias teorias pseudocientíficas geraram um terreno propício para que alguns autores vissem na ambientação em lugares exóticos uma maneira de criticar a própria sociedade em que viviam ou então refestelar-se em pornografia ou ideais vanguardistas sem o risco de censura. A força da tradição, a idolatria recorrente do passado (clássico ou medieval), a importância de instituições como a Igreja e o Estado… tudo isso atuava em favor do estabelecimento de um subgênero que abrigava a subversão de uma forma socialmente tolerável.

É nesse sentido que Richard Burton consegue transferir para a Índia as perversões sexuais dos fidalgos, que Bram Stoker (talvez inconscientemente) sublima o caráter predatório da nobreza britânica na figura de um nobre vampiro estrangeiro etc. Os mais otimistas, porém, sonham com um mundo no qual as nuvens negras de fumaça industrial, os bolsões de pobreza e uma “degeneração dos costumes” são superados por descobertas científicas: a ciência salvaria o mundo que a religião mal conseguia ajudar. Eram tempos ingênuos aqueles.

À medida em que o mundo evoluía através de guerras mundiais, epidemias, surgimento de crime organizado, conspirações de estado, crises econômicas e uma total hipocrisia política, a idealização do mundo perfeito se torna mais forte. Mas o pessimismo avança, fazendo com que a perfeição fosse muitas vezes localizada no passado. Em J. R. R. Tolkien, por exemplo, o que predomina como temática é a decadência dos povos, o fim iminente do mundo, o risco permanente do triunfo do mal absoluto etc. A salvação da humanidade, representada pela destruição do anel, ocorre por puro ato de graça do Destino, um legítimo deus ex machina.

Muita gente no Brasil adquiriu esse pacote fechado de venenos ideológicos sem olhar o que tinha dentro. Sem entender o mecanismo (e principalmente sem entender os arquétipos em uso), essas pessoas acabaram adotando fim em si aquilo que ficava apenas na superfície: gente que se veste de elfo da Terra Média sem entender que os elfos são o arquétipo da pureza angélica (congênita, indiferente e fria) da humanidade. Trata-se de uma compreensão infantilizada porque não evolui, não acrescenta; limita-se a repetir fórmulas e repassar receitas. Assim são os imitadores: em vez de verem no vampiro a inspiração para outras histórias de outros monstros, que refletem os nossos medos, eles apenas transcrevem o medo estrangeiro, muitas vezes sem sequer tentar uma tropicalização. O resultado, me desculpem os que me leem, não é literatura de verdade, é literatura de brinquedo, é fanfic.

Que isso venda livros e dê lucro a quem faz é algo que não importa: esse artigo não é sobre meios fáceis de ganhar dinheiro, fazer amigos e influenciar pessoas. Mesmo porque, se eu soubesse como fazer essas três coisas eu não tinha um blog, eu escrevia num jornal de grande circulação.

Quando digo “fanfic” eu estou me referindo a imitações superficiais, alienadas e anacrônicas de obras cujo contexto e cujo subtexto não foram foram compreendidos pelo imitador. Superficial porque não vai além do uso emblemático, caricatural, esquemático dos arquétipos contidos nos textos em que se baseia. Alienado porque imita servilmente um modelo estrangeiro e não usa quase nada da rica cultura de nosso país. Anacrônico porque reflete o estado de espírito de uma outra época, que tinha outras preocupações e desafios.

Em relação ao caráter anacrônico, realmente não há desculpa, mas há um modus operandi: os imitadores sem talento gostam de pinçar justamente o mais datado, o mais superficial, o mais esquemático. A imitação procura ser fiel no acessório porque ele é mais portátil, ele não requer aprofundamento crítico.

Como a literatura é algo pouco valorizado, às vezes até ridicularizado, o brasileiro médio não consegue acessar toda a profundidade do que lê e essa superficialidade passa para o que tenta escrever. São bem poucos os novos autores que eu estou conhecendo que parecem possuir alguma cultura literária. Em vez disso, as crias da internet parecem ostentar sua ignorância como uma medalha.

Embora a literatura tenha já uma boa tradição entre nós, os novos autores a desconhecem ou rejeitam-na (“Odeio Machado de Assis”). E porque lê pouco, muito ignora e mal sabe o quanto isso lhe faz falta. Esse ranço anticultural passa de geração a geração, desde os tempos dos coronéis. “Ler é um exercício”, afirmou certo político suado de lutar contra as palavras, como diria Drummond. Isso vem desde os tempos em que o coronel analfabeto detinha o poder e o homens da cidade, devidamente diplomados, eram seus empregados.

A falta de cultura geral, trazida por leitura frequente e variada, faz com que o leitor brasileiro médio tenha dificuldades para destrinchar os significados dos textos mais provocativos. Isto resulta em pastiches mal-feitos do Senhor dos Anéis, reescrituras desnecessárias das Crônicas de Nárnia, platitudes sobre as Mil e Uma Noites vendidas como pérolas de sabedoria por magos midiáticos, imitações precárias de Stephen King ou grotescos esforços para tentar ser J. K. Rowling.

Os livros e os personagens são reduzidos a estereótipos, e são esses estereótipos que são imitados. Os vampiros sobre os quais se escreve são baseados nos de Anne Rice, os magos são como Dumbledore ou como Gandalf, os elfos são como os Sindarin, etc. Alguns “ousados” misturam referências de mais de uma obra, mas ainda assim é “fanfic”, do tipo “crossover”.

Como as pessoas geralmente só leem do que gostam (outra característica da estratégia de “redução da dor” empregada por pessoas para quem ler é realmente muito penoso), o gênero favorito serve como cercadinho intelectual que retarda seu crescimento mental. Elas leem, leem, e nunca aprendem porque sempre leem mais do mesmo. Chegam à idade adulta lendo livros sobre anjos da guarda, magos do Oriente, Deuses Astronautas…

Ninguém tem que saber tudo, mas tudo que se sabe é um tijolo a mais na construção de uma personalidade versátil. Cada livro tem algo a nos ensinar, e é importante sabermos um pouco de várias coisas para não sermos “bitolados”. O trem só é capaz de seguir os caminhos que foram preparados para ele no passado, mas os pássaros voam livres para onde querem. Ler livros de um gênero só é ser como um trem, “bitolado”.

Porém, aquilo que você lê precisa resultar em alguma coisa. Não pode entrar por uma orelha e sair pela outra. Quando você realmente aprende algo, este algo passa a ser parte de você e recebe a sua contribuição. “Quem conta um conto aumenta um ponto” quer dizer que você sempre tem vontade de contar de outra forma, mesmo a melhor história que leu. Essa vontade é o germe da literatura na alma da pessoa que lê. Ninguém se torna escritor antes de ter sido um bom leitor.

É isso que prejudica muitos autores nacionais: ao não reciclar suas fontes, eles não vão além da superfície das histórias que leem, ambientadas em paraísos estrangeiros ou países alienígenas (ou seria o contrário?), sem notarem que os cenários são deliberados, que estas obras possuem uma mensagem conectada com o mundo real, que não são mero escapismo.

Apegar-se à letra, não ousar discordar de como as histórias foram contadas, não ter sonhos próprios para transformar em ideias… Males de um povo que tem preconceito contra si mesmo, que acha que as suas histórias não merecem ser contadas. Sim, vivemos sonhando em contar as histórias dos outros povos e desprezamos as nossas. Nossos jovens não querem ler autores regionais, detestam sotaques sulistas, nordestinos, mineiros… Enquanto isso uma recente música de sucesso falava, como se fosse algo desejável, de um vaqueiro do interior de São Paulo com sotaque “meio americanizado”.

Aqui em Minas Gerais temos um verbo suficientemente ofensivo para esses casos: “macaquear”. Macaquear é imitar grotescamente. Tal como um chimpanzé que tenta agir como humano, mas claudica e faz caretas sem sentido. Devíamos parar de “macaquear” a cultura estrangeira e começar a contar a nossa história. “Nossa” não no sentido de nacionalismo fútil, mas no sentido de experiência própria — que até pode incluir referências aprendidas com outras culturas. O mundo de um autor é o mundo que ele vê e vive.

Pode parecer perseguição ou preconceito, mas é fato: nenhuma imitação barata de best-seller estrangeiro fará sucesso lá fora e tornará seu autor uma personalidade famosa, porque nenhuma imitação pode ter qualidade técnica, artística ou cultural para fazer frente ao mais simplório dos best-sellers prefabricados que vêm dos Estados Unidos. Isso decorre, primeiro, do fato de que os livros mais comerciais publicados nos EUA e Inglaterra passam por um processo de edição e preprodução que nossas editoras não têm como financiar, e segundo, da impossibilidade de obter acesso recíproco ao mercado “deles”, pelo menos não fazendo aquilo que eles fazem de melhor. Se eles não conseguem fazer samba melhores do que nós, certamente nós não conseguiremos fazer livros rasos tão bem quanto eles (e nesse contexto “fazer bem” não envolve qualidade, mas agradar ao público). A única chance de carreira internacional que um autor fora do circuito anglo-americano-australiano pode ter está na sua originalidade, em oferecer um assunto novo.

Mas como se isso não bastasse, resta uma verdade dolorida: uma boa parte do que se publica hoje no Brasil, no gênero ficção científica e fantasia, é bem pior que “Crepúsculo”. Tem muito autor por aí falando mal de Stephanie Mayer que deveria, sinceramente, lavar sua boca antes de vomitar acusações contra ela. No mínimo, mesmo o pior dos romances comerciais americanos tem um enredo estruturado, passa por várias e boas revisões e só chega ao mercado depois algumas sondagens com leitores qualificados, que apontam fraquezas a serem sanadas. Aqui tem muito autor se acha um deus e reage ofendido a todo e qualquer comentário que não se baseie em entusiásticos aplausos.

É uma postura inculcada neles por um sistema educacional falido, que não exige aprendizado, que não propõe desafios, mas aplaude o “esforço” mesmo que ele redunde em nada. Por isso tanto autor por aí se acha especial, se acha gênio, acha que tem “inspiração” e chama de “censura” a toda e qualquer interferência que um editor queira fazer. Para essa gente, gramática é coisa de sujeito afetadinho, a estrutura é a prisão da idéia e apontar erros é faltar com o respeito ao autor. Mal sabem eles que a precariedade do texto é que é a prisão da idéia, tal como a falta de horizonte cultural agrilhoa o raciocínio.

As editoras não abrem mais espaço para nossos autores porque eles são amadores mesmo, porque há gente demais fazendo cópia mal-feita de autor americano. Os bons ficam perdidos nesse mar de inutilidades. É mais seguro para elas buscar obras já testadas e aprovadas do que tentar testar e aprovar aqui outras obras cujo alcance ficaria, de qualquer forma, limitado às nossas fronteiras.

Para piorar tudo, os autores orkutianos são desorganizados, sem foco e muito narcisistas. Desejam fazer sucesso escrevendo, mas não gostam de ler o que outros escrevem. Desejam ser famosos, mas não querem comprar livros de outros autores. Querem ser bem-sucedidos, mas não querem dar-se ao trabalho de buscar pessoalmente a qualidade de seu texto (“alguém vai revisar para mim”). No fundo esperam que alguém magicamente transforme seu sonho de fama em realidade. E pelo simples fato de estarem escrevendo, já incorporam o personagem “artista” — chegando ao ponto de colocar em seus apelidos virtuais termos como “poeta” ou “escritor”, como aqueles ridículos médicos do interior de antigamente que exigiam ser chamados de doutor até quando estavam de sunga no clube e pediam que os bancos imprimissem nos seus talões de cheque “Fulano de Tal, Dr.”.

Se você acha que isso é mentira, vá até a sua estante e me diga quantos livros de jovens autores você possui, quantos leu. Negue sinceramente que você se ofendeu quando alguém lhe disse que precisava melhorar. Ou então me explique de que forma você entende o mito do monstro de Frankenstein no contexto da cultura de sua região.

O sucesso continuará sendo impossível enquanto continuarmos cometendo os mesmos erros. Persistência é só um nome bonito para a teimosia, a menos que você saiba o que está fazendo. Enquanto o “autor” não conhecer diversos gêneros, não possuir um posicionamento face à tradição, não acompanhar a mídia especializada, não estiver antenado com as notícias e com as novidades culturais, não há opção a não ser continuar dando dinheiro para editoras que publicariam qualquer coisa em troca de três meses de seu salário.


09
Nov 10
publicado por José Geraldo, às 22:16link do post | comentar

Um livro “xarope” é aquele que consegue o milagre de ser enjoativamente doce, mas tem um gosto ruim. Geralmente você lê esses livros porque alguém diz que vai ser bom para você. O consumo frequente pode levar à dependência e o efeito do consumo é meramente sedativo daquilo que o incomoda.

  1. Personagens: anjos, duendes, fadas, gnomos, elfos e quaisquer seres que andem descalços, tenham asas ou andem com eternas expressões sorridentes no rosto.
  2. Imagens na capa: céu azul, sol poente, cachoeira entre pedras, flores, samambaias, animais selvagens correndo livres; qualquer coisa dessas.
  3. Palavras no título: amor, amizade, afeto, união, luz, palavra, vida, sentido, paixão etc.
  4. Quantidade de páginas: convenientemente fino, com não mais que umas 130 páginas.
  5. Tamanho das letras: 120% ou mais o tamanho normal que você vê nos outros livros. Um aumento imperceptível aos olhos dos fãs desses livros, mas que é visto facilmente por quem está acostumado com tipografia.
  6. Desenho interno: ornamentos florais separando seções, títulos de capítulo em fonte pseudo-manuscrita, títulos de capítulo escritos sobre um plano de fundo com reproduções em preto e branco do mesmo tipo de imagens citado no item 2.
  7. Desenho interno: impressão de texto em sépia, malva, violeta, azul-marinho ou verde.
  8. Ilustrações de pessoas (tanto na capa quanto no interior): faces inexpressivas ou aparentando dor ou êxtase, olhos voltados para cima, gestos simétricos, pose estática.
  9. Roupas das pessoas nas imagens: em estilo “bíblico” (pseudo hebraico antigo) ou “medieval” (ou seja, vestes semelhantes aos reis e rainhas da Renascença usadas por camponeses de uma suposta Idade das Trevas). Alternativamente, roupas contemporâneas, mas singelas e em cores suaves.
  10. Argumento de venda: “uma importante lição”, “ensinamentos para a vida”, “revelações importantes”, “descubra seu potencial” e coisas assim.
  11. Orelha, prefácio ou equivalente: quando existe, é assinado por algum líder religioso ou por alguém que se apresenta como executivo de uma grande companhia. Em geral um recomenda o outro, isso quando o autor não tenta ser simultaneamente os dois (“guru das vendas”, “mago da administração” etc.).
  12. Perspectiva de “desova”: pequena, pois todas as bibliotecas do seu bairro já devem ter, seus amigos já aprenderam a lição em algum grupo de auto-ajuda ou algo assim. Você vai tentar valorizar dizendo que é um livro que você jamais daria a alguém por causa de seu valor. Com isso, a única pessoa que talvez o aceitasse de você vai ficar resignada e comprar um.

06
Out 10
publicado por José Geraldo, às 07:22link do post | comentar

No tempo em que eu ainda participava ativamente de comunidades literárias do Orkut, antes de ser reduzido a uma impessoa pelo proprietário delas, eu postei um trecho de um romance que estou desenvolvendo, que tem o título provisório de “Serra da Estrela” (cada dia gosto menos desse nome). Trata-se de um romance do gênero suspense/terror ambientado em algum lugar no interior de Minas Gerais (talvez um lugar que só exista em um universo paralelo) e cujos principais personagens são um lobisomem, uma mula sem cabeça e uma iara — sendo a mula a personagem mais importante dos três. Pois bem, ao postar esse texto eu recebi alguns comentários curiosos, que muito me fizeram pensar…

Pelo menos dois dos comentários eram de jovens internéticos e conectados que se sentiam pouco à vontade com o cenário e com os personagens — tal como os meus primos paulistas que, certa vez, nos meus tempos de infância, se surpreenderam ao ver uma vaca no sítio de meu pai e comentaram que “lá no Brasil não tem vaca”. O primeiro desses garotos comentou que tinha gostado do clima “noir”, mas que achava que a dinâmica da história não combinava com uma ambientação “exótica”. O segundo adicionou que o lobisomem não estava coerente com a mitologia estabelecida a respeito do personagem.

Na época eu preferi não comentar, porque nenhum comentário em relação a estas duas colocações poderia ser educado. Ou melhor, nenhum comentário apropriado que eu fizesse seria aceito como “educado” pelos dois receptores. Por isso preferi ficar quieto e não cultivar dois inimigos, dois não-leitores de minhas obras.

Mas a verdade, verdadeira, é que foram duas observações de uma imbecilidade relinchante. A primeira porque o sujeito que reside no Rio de Janeiro foi chamar de “exótica” a ambientação de uma história no interior de Minas Gerais, que ele pode conhecer simplesmente pegando um carro e dirigindo por três horas e meia para o norte. A segunda porque parte do pressuposto de que o personagem lobisomem que aparece no cinema é o “verdadeiro” lobisomem. No primeiro caso temos uma alienação completa em relação à cultura brasileira (pois dificilmente o garoto em questão chamaria o meu texto de exótico se eu o tivesse ambientado em upstate New York), e no segundo, uma falta de referência literária que é simplesmente indesculpável em alguém que diz gostar de literatura.

O primeiro comentário foi um dos que me inspiraram a escrever o Mistério Islandês, que pretendia satirizar a ambientação de textos em lugares “exóticos”, como os Estados Unidos ou o Japão dos mangás. A sátira falhou, claro, porque embora eu tenha tentado demonstrar o ridículo de se escrever sobre lugares aonde nunca fomos, muita gente tem dito que o texto ficou ótimo e eu não passo uma semana sem receber um pedido para continuar escrevendo a história. Mundo louco esse.

Eu continuo, desde aquela época, matutando sobre o significado, a longo prazo, de termos uma juventude que considera “exótica” uma obra literária ambientada no interior de Minas Gerais. Se pelo menos eu fosse amazonense e escrevesse sobre coisas de lá, ainda seria aceitável que um carioca tivesse algum estranhamento, mas do jeito que a coisa vai, daqui a pouco gente de Juiz de Fora vai achar que é exotismo eu escrever sobre Cataguases e Leopoldina.


11
Set 10
publicado por José Geraldo, às 17:42link do post | comentar

Hoje deparei-me com a chegada à blogosfera de um companheiro orkutiano de longa data, o Sérgio «33» Ferrari. Se você quer saber quem ele é, não peça detalhes de sua biografia, apenas leia Croma Silvana e o Jantar Quadriculado.


28
Ago 10
publicado por José Geraldo, às 23:24link do post | comentar
É preciso ter a ingenuidade que só a ignorância permite.Somente assim é possível a coragem de dizer certas coisasque, mesmo ecessárias,permaneceriam caladas na boca do sábio que as reconheceditas por outras bocas, de outros sábios.Lá fora brilha um sol de versos e de florese os sorrisos denunciam que morreu o inverno.Outro poema aberto jaz diante dos autoresE ninguém consegue expressar sua certeza nele.Porque esse poema ecoa outro poema que nasceu de outronuma genealogia infinita de palavras que concordam.Nossa ambição do novo nos impede o prazer do óbvio:o prazer de ainda ser parte do que existe.Não, não pode, na mente emaranhada do poetacaber tanto conhecimento que não sobreignorância que se possa preencher com fantasia.Os sábios perceberam jáe pararam de falar.

publicado por José Geraldo, às 09:50link do post | comentar

No dia 13 de março de 2010, durante um debate no Orkut com alguém que tentava me convencer de que não há na literatura inteira nada mais genial do que o microconto (e citando como exemplo o famoso aforisma de Augusto Monterroso “Cuando despertó el dinosaurio todavía estaba allí”), eu me propus a produzir trinta microcontos em trinta minutos, concedendo a um grupo de “árbitros” escolhidos por mim a prerrogativa de desqualificar (“esse não é um microconto”) qualquer texto que desejassem, até o número máximo de dez.

Comecei então a escrever os microcontos, sem preocupação em publicar simultaneamente. O tempo necessário para fazer a postagem no próprio tópico estava incluído nos trinta minutos do prazo, razão pela qual eu preferi postar tudo no fim.

Infelizmente, não consegui cumprir o desafio por causa de um “bloqueio criativo” lá pelos vinte minutos. Quando o superei, lá pelos vinte e sete, não houve tempo para completar o desafio no tempo estabelecido. Mesmo assim, tendo perdido o tempo, eu acabei escrevendo quarenta e dois minitextos em quarenta minutos, dos quais doze (os que estão em itálico na lista abaixo) foram desqualificados.

Considerando que, afinal, eu tinha conseguido produzir trinta microcontos em quarenta minutos, os árbitros concluíram que eu teria conseguido produzir, proporcionalmente, vinte e dois em trinta minutos. Uma média tão alta que mesmo eu tendo perdido o prazo o meu argumento foi considerado vencedor.

A seguir, a lista dos microcontos escritos naquele dia

  1. Ele dizia: “ama ao próximo como a ti mesma!” Ela disse: “o próximo!”
  2. “Amor, você está tão triste hoje! Não precisava ficar assim só por causa dos últimos seis anos.”
  3. “Tinha vinte anos de janela.” Epitáfio de um operário do ramo de serviços gerais.
  4. Conheceram-se pelo Orkut. Desconheceram-se ao vivo.
  5. Os deuses devem estar mortos — pensaram. Então fizeram o sacrifício semanal.
  6. O guerreiro perdeu seu escudo num bordel. Homossexual. Diziam as más línguas.
  7. “7º — Não adulterarás” — ia dizendo Deus. Os israelitas inconformados pediram: “Corte o sete, corte o sete.” Por isso durante séculos o algarismo sete foi escrito com um corte.
  8. Passei a manhã na praia, o sol não veio, o mar sim.
  9. Manhãs de sol trazem brisas felizes — escrevia a suicida sentada à janela.
  10. Uma avezinha pousa em minha mão todas as vezes que a dor de escrever passa. Então ele me bica e diz: “Você passará, Quintana passarinho”.
  11. Aposentou-se por invalidez o fulano. Não valia nada.
  12. — Vamos à montanha?
    — Não quero estar perto dela, pois não a posso escalar.
    — Nós o levaremos.
    — De que adianta me levarem, se não podem sentir por mim?
  13. Ninguém nunca termina de escrever sua autobiografia.
  14. A maior mentira do mundo — pensava o editor — é quando eu pego o espólio de um autor e ponho num volume único intitulado “Obras Completas”.
  15. “Os antigos voltaram! Os antigos voltaram!” A cada verão alguém descobre isso e faz uma nova revolução.
  16. A carícia com afinco se parece com sevícia — desculpava-se Vlad, o Empalador.
  17. “Perdi metade do dia nisso, convém que perca a outra metade.”
  18. Há uma profunda responsabilidade em ser profeta. A vírgula mal posta hoje será a Inquisição do próximo milênio.
  19. Toda frase que começa tentando abranger tudo sempre termina como as outras, no ponto final…
  20. O muro ocultava o murmúrio dos moradores. Um silêncio suspeito ficava toda vez que algum chegava. Ruídos de alegria quando alguém saía.
  21. “A verdade dói, especialmente quando demora a sair”-- disse o torturador.
  22. Não há tortura pior do que estar sozinho, especialmente se você está certo. Especialmente em uma ilha deserta. Pior ainda no deserto de si mesmo.
  23. Mesmo morcegos mal-humorados moram. Muitos meditam, mas mal.
  24. “Eu tenho um plano” — foi o próximo a morrer no filme.
  25. “Os tolos perdem no fim” — visão idealista. “Tolos são os que perderam” — visão prática.
  26. “Technically, a vampire is a sucker.”
    “Please, do not offend our guest.”
  27. “O carteiro me trouxe uma carta branca hoje,” disse o lunático que assaltou o banco.
  28. “É preciso estar feliz para ver a alegria dos passarinhos”. “É preciso estar alimentado” — disse o outro gavião.
  29. “Nasceu em 1943.”
    “Morreu em 1987.”
    “Morreu em 1989.”

    “Tem algum erro aí,” observou o menino.
    “Rápido, guri, volte para o carro porque está anoitecendo.”
  30. Os Antigos Gatos só ensinaram seu pulo aos gatos modernos.
  31. Acidentou-se com uma folha de papel-ofício. Usou-a para escrever as palavras proibidas, “eu te amo”.
  32. “Bad films suck! Porn stars suck!… er… sorry for my fingering… I mean, my thinking…”
  33. Homens e mulheres discordam num ponto. G.
  34. “Sou virgem,” disse ela. “Que bom, combinaremos bem, sou Libra,” disse ele.
  35. “Querido, só ontem descobri quem foi Lady Godiva. Se você não tivesse sido tão literato eu teria usado a fantasia para você há muito tempo.”
  36. O sábio chinês cochichou no ouvido do aluno: “nunca conte a um brasileiro que nem todos aqueles ditados são nossos”.
  37. Namorava uma russa. Ele deixou a barba crescer porque ela lhe disse que gostaria que ele se parecesse com Rasputin. Ela não gostou e terminou. Anos depois descobriu que as mulheres não gostavam de Rasputin por causa da barba, mas do pênis de quase trinta centímetros.
  38. “Acho que perdi meu tempo com você”, disse Cronos a Réia.
  39. Quando acordou sentiu-se menos homem. Felizmente era mulher.
  40. Ganhou o apelido de Fênix porque aparecia bem-humorado nas quartas-feiras de cinzas. No resto do ano vivia esquentado.
  41. — Vou lhe dar três chances.
    — Ok, posso tentar a primeira?
    — Muito bem, então diga.
    — Dizer o que?
    — A respostas, bolas!
    — Uai, mas como…
    — Acertou!

    A pergunta do programa de televisão era “para que serve uma banana”.
  42. “Nunca mais vou querer saber o que é amor platônico”, disse, dolorido, o jovem discípulo de Platão enquanto voltava para casa.

mais sobre mim
Março 2013
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2

3
4
5
6
7
8
9

10

17
18
19
20
21
22
23

24
25
26
27
28
29
30

31


comentários novos
Ótima informação, recentemente usei uma charge e p...
Muito bom o seu texto mostra direção e orientaçaoh...
Fechei para textos de ficção. Não vou mais blogar ...
Eu tenho acompanhado esses casos, não só contra vo...
Lamento muito que isso tenha ocorrido. Como sabe a...
Este saite está bem melhor.
Já ia esquecendo de comentar: sou novo por aqui e ...
Essa modificação do modo de ensino da língua portu...
Chico e Caetano, respectivamente, com os "eco...
Vai sair em inglês no CBSS esta sexta-feira... :)R...
pesquisar neste blog
 
arquivos
blogs SAPO