Em um mundo eternamente provisório, efêmeras letras elétricas nas telas de dispositivos eletrônicos.
16
Nov 12
publicado por José Geraldo, às 23:27link do post | comentar | ver comentários (3)
Uma amiga postou hoje «numa rede social» (estilo Rede Globo de mencionar não mencionando) que estava com vontade de largar tudo e sumir. Minha primeira reação ao ler o seu comentário foi um pensamento singelo: por que pensamos sempre que, antes de fugir, temos de largar tudo. O que é esse «tudo» e o que representa esse «largar»? Fugir para onde?

Alguém já disse que a Aldeia Global significa que não haverá asilo para ninguém em lugar algum. A frase foi dita num contexto político, mas não é preciso ser um dissidente para se sentir desalojado neste mundo: aonde poderemos ir e achar a paz? Fugiremos para que parte do planeta? Por que não podemos levar «tudo» para lá?

Talvez seja porque exatamente «tudo» seja o que nos faz ter vontade de fugir. Temos «tudo», e isso significa uma falta imensa, um buraco indefinido, que em alguns tem a forma de Deus, em outros tem a forma de qualquer coisa que elejam como séria. Temos tanta coisa. Talvez sonhemos com uma época mais feliz, em que poderíamos carregar «tudo» em uma mochila e sair perambulando pelo mundo. Uma época em que éramos bosquímanos nos planaltos da África Austral, verdadeira felicidade.

Como eu poderia fugir amanhã pela manhã, se isso fosse necessário? Poderia eu desaparecer deixando para trás todos esses móveis, esse computador, minha coleção de discos de rock, minha pequena biblioteca, minha impressora laser, minha geladeira frost-free, minha televisão com tela de plasma de 36 polegadas? Poderia eu carregar meu aparelho de telefone celular, meu cartão de crédito, meus remédios controlados, meu fio dental mentolado e o papel higiênico macio? Quanto de minha vida cabe no meu carro? Poderia eu fugir num carro? Como pagar pela sua gasolina depois de alguns quilômetros?

Largar tudo e fugir, a suprema utopia. O único lugar aonde ainda podemos ir sem levar «tudo» é o túmulo, pois da vida só o «nada» se leva. Enquanto isso vivemos ancorados em nossos portos inseguros, amarrados a armários, fogões, fornos de micro ondas, baixelas de aço inox, e todos esses confortos.

Ontem à tarde, ao voltar de Leopoldina, topei com dois andarilhos pela estrada. Sujos, magros, despenteados, mas vestidos com alinho. Ele com um terno amarrotado e ela com uma roupa de estilo indistinguível. Caminhavam lentamente, com a pouca pressa de quem sabe que vai chegar, fatalmente. Iam trocando palavras e gestos de afeto. Observei-os pelo retrovisor até eles sumirem na curva: ali estavam dois que poderiam fugir largando tudo. Talvez até já tivessem largado. Até mesmo suas vidas. Vagam pelas estradas como fantasmas sem destino. Possuem o nada.

Não os invejei, porém. Gosto das minhas âncoras, de todos os certificados que coleciono em pastas bonitas. Gosto desta varanda. Não quero largar tudo e fugir, mesmo sentido o peso de todas estas coisas tolhendo as minhas pernas aos poucos, mesmo que tudo me afogue devagar, num mar de compromissos e contradições. Talvez a minha amiga, como eu, saiba que não é possível mesmo largar tudo, não sem largar a vida. Estamos condenados ao tudo.

18
Out 12
publicado por José Geraldo, às 01:17link do post | comentar | ver comentários (1)
Decidi-me a um passo radical nas minhas relações facebookianas. Estou começando a cortar relações com pessoas com quem não tenho conhecimento direto e, simultaneamente, não formam, em minha opinião, um público potencial para a minha literatura. Vou cortando esta turma porque estou cansado de conversas vazias que não vão a lugar nenhum, cansado de gente cheia de certezas, idênticas ou opostas às minhas.

Acredito que esta medida higiência me favorecerá bastante. Ajudará a me manter afastado da internet e mais perto de coisas como árvores, bichos e trabalho. Mesmo que não tenha esse condão, pelo menos me afasto de uns malas.

Esta semana fiquei conhecendo três.

O primeiro mala é aquele cara que posta coisas e depois reclama se você comenta. O segundo é o mala que te adiciona a grupos que ele acha que você quer participar. O terceiro é o mala que só sabe falar em Jesus.

Eu digo que fiquei conhecendo esses malas somente esta semana porque eu nunca tivera a oportunidade de trombar com eles. Mas tenho a certeza de que já os intuía antes: alguns me acompanhavam desde os tempos de Orkut.

Meu contato com o primeiro mala ocorreu quando ele postou um comentário qualquer, de cunho extremamente provocador. Era alguma coisa sobre uma campanha para desacreditar a campanha movida por alguns grupos na internet em favor de que seja também julgado o chamado «mensalão mineiro». Seu comentário foi o de que não há necessidade de julgar nada daquilo, porque é tudo mentira mesmo, já que a justiça até hoje não achou o que julgar, ou algo assim. E que o livro «Privataria Tucana», que acusa os acusadores do atual governo, seria uma «peça de ficção». Quando eu comentei que ele estava agindo movido por fé cega, sem prestar a mínima atenção à coerência, o mala me atacou com uma versão sofisticada daqueles dizeres de auto ajuda barata, algo como «eu nunca fui poluir o seu mural com as minhas opiniões, por que você vem me criticar no meu?» Senti-me atingido porque, de fato, era o mural dele e, de fato também, ele nunca comentara suas opiniões de ultra direitista no meu mural. Mas se eu não tenho o direito de comentar, mesmo acidamente, o que um «amigo» posta em seu mural, então esse não é um «amigo» meu, apenas um sujeito que está adicionado, sabe-se lá por que acaso. A única reação possível, diante da distância ideológica e da necessidade de preservação de seu cercadinho mental, foi a que tomei: desfazer a amizade. No momento em que o fiz, percebi que existem dezenas de outros «amigos» meus que tampouco são amigos: porque não tenho conhecimento pessoal seu, e nem confiança para, em algum momento, comentar livremente o que postam. Amigos que só aceitam comentários laudatórios ou neutros não são amigos. São pessoas que precisam ser ignoradas.

O segundo tipo de mala é mais sutil e, de fato, eu não tenho enfrentado esse problema nas últimas semanas, desde que excluí alguns adicionadores contumazes. Mas foi só nesta semana que eu percebi que essa prática também é um abuso, e um motivo para não somente eu excluir os «amigos», mas a própria conta no Facebook. Aguardarei o lançamento do segundo livro e talvez o faça.

O terceiro tipo de mala tem me atacado menos, e esse era, talvez, o que eu mais tinha noção anterior de sua existência. O que mudou esta semana foi a percepção de que, invariavelmente, a pessoa que toca no assunto Jesus nas primeiras vezes em que você conversa com ela é alguém que tem Deus na cabeça — e mais nada. Existem muitas pessoas que acreditam em Deus e são simpáticas, mas há pessoas que acreditam que a crença é uma desculpa para ser mala permanentemente ou,  pior, que se tornam tão obcecadas que se tornam malas sem querer. Eu não tenho saco para discernir os dois tipos: ignoro ambos.

Há outros tipos de malas bastante incômodos também, como o mala prolífico, aquele que resulta em 76 notificações de atividade, ou o mala científico, que é uma espécie de crente pregador das últimas descobertas científicas. Ambos são de dar dor de dente em galinha. Imagine você abrir suas notificações e ler que «Beltrano de Tal curtiu uma notícia em G1.com», daí você clica e lê que «Mônica Bérgamo (quem?) prepara pizza com Angélica». Ou, no caso do mala científico: «Observatório americano descobre que Plutão tem 0,5% mais merdato de bóstium do que se esperava — descoberta deve revolucionar a teoria das brânquias hipersônicas de Andrômeda». Daí você passa à notificação seguinte e outro «Fulano de Tal» curtiu uma página com «Todos os personagens de 'Malhação' se reúnem para homenagear Zé Ninguém das Couves». Você ignora, mas a notificação seguinte, novamente, do amigo científico, lhe lembra «Asteróide de 0,025 toneladas passou a 0,05 unidades astronômicas da Terra nesta noite». Daí você assusta achando que foi algo grande que passou perto e descobre que foi uma bosta de pedregulho irrelevante de 25kg que nos errou por um vigésimo da distância até o Sol.

Eu estava acostumado a conviver com esses dois malas, e mais o que a cada cinco minutos compartilha um versículo fofoso da Bíblia, ou uma pérola de auto ajuda. Nesta semana percebi o incômodo dos malas políticos que, por uma estranha coincidência, estão inundando o Facebook de calúnias contra o Fernando Haddad, o Lula, o Hugo Chávez e até contra as cerejas de bolo (porque também são vermelhas). Já vi gente dizendo que «Serra é lindo» (tem gosto para tudo, até para vômito) e outro dizendo que «tinha mais é que acabar com essa merda de democracia para afastar esses petralhas do poder». Sei muito bem o que é isso: é uma campanha de astroturfing em plena ação. Esses idiotas aparentes não vão continuar postando isso depois que acabar a eleição: quem está pagando vai deixar de exigir produtividade e eles vão voltar a compartilhar auto ajuda ou notícias irrelevantes, só alguns mais impressionáveis vão continuar bajulando os candidatos. É difícil conviver com isso, não tenho mais tanto tempo. Prefiro cair fora e torcer para eles caírem na real quando precisarem trocar as fraldas, melhor do que caírem na real quando houver tanques nas ruas, e não para lavar roupa suja.

Então, para evitar esse desgaste de meu humor, estou apagando essa gente chata e dedicando meu tempo livre a assistir os filmes do Monty Python e a pesquisar na Internet por discos de violeiros. Isso enquanto O Pecado da Tristeza não sai — e já tá demorando uma meia eternidade.

02
Out 12
publicado por José Geraldo, às 00:14link do post | comentar | ver comentários (1)

Às vezes a palavra que dizemos corta inadvertidamente quem está perto. É como brandir uma espada longa1 em círculo sem saber que alguém chegou pelas nossas costas. Culpa da espada? Do espadachim? Da vítima? Ou mero acaso.

Anteontem ofendi seriamente um amigo facebookiano por causa de minha postagem aqui.

Postei pensando num hábito irritante de dois ou três debatedores em um grupo político onde participo, sujeitos pedantes que gostam de pontuar suas frases com barbarismos léxicos achando que assim se mostram descolados. Essa fato me puxou o fio de muitas memórias, desde os tempos de Orkut, quando me cansei de ver garotos de 16 anos que tinham ido à Disneylândia achando que tinham cabedal para escrever um romance ambientando nos States.

Este amigo facebookiano me escreveu pedindo meu voto em uma espécie de concurso que está sendo promovido pelo Clube de Autores.

Mal sabia que o amigo facebookiano justamente me pedira para opinar num caso desses. Ele é o autor amador de um romance que começa por um título em inglês, que está ambientado em algum lugar dos Estados Unidos e tem uma história chupada diretamente dos filmes de terror americanos. Eu ainda não opinara, afinal o pedido era recente e eu tinha motivos razoáveis para supor que teria bastante tempo para analisar o livro e decidir se merecia ou não o meu voto. O fato de eu passar os fins de semana longe de meu computador pessoal era motivo suficiente para eu esperar pela semana.

Porque eu jamais daria meu voto sem ler a obra. A função de um concurso não é votar por amizade e nem pela beleza da capa: se esse era o tipo de voto buscado, buscou com a pessoa errada.

Então, inocente do conteúdo da obra que eu deveria avaliar, postei o que postei e segui com a vida. Hoje ao abrir o facebook me deparei com um irônico «agradecimento» do meu amigo e senti cheiro de coisa errada. Cliquei na ligação para o voto e detectei na hora de que se tratava.

Imagino que o meu amigo tenha razão para estar ofendido. Receber uma crítica é sempre ruim, porque de certa forma é como se alguém nos contasse que não somos geniais. E todo mundo se acha especial, genial. Mesmo uma crítica enviesada como essa, que só o atingiu na base do efeito colateral e da carapuça espontaneamente vestida.

Ao meu amigo só posso dizer que se acostume, e que aproveite. Viver para a arte é assim. Você se esforça e depois vem um idiota e diz que o seu trabalho é uma porcaria. Às vezes você passa a vida inteira sendo desvalorizado por idiotas e vira gênio depois que morre. Mas em muitos casos os idiotas têm razão e as pessoas ficam pensando porque você insistiu tanto, como o motorista da piada do barbeiro na contramão da Via Dutra.2

No fim das contas é muito difícil quem escreve, compõe ou faz qualquer coisa artística conseguir ter uma visão clara e definida da qualidade do que escreve. Em geral esta visão só se consegue com o tempo. Com cabelos brancos que nos embaçam os olhos e nos fazem enxergar o valor real do que fazíamos aos vinte anos. Para sorte da literatura nós só adquirimos a sabedoria tarde demais, e temos tempo de ser ousados antes, para o bem e para o mal — mais frequentemente para o mal, mas os fracassos se perdem no esquecimento, então não há nenhum grande prejuízo, a não ser para quem se ilude.

Muito Nero morre tangendo sua lira, sem nunca entender porque as plateias não aplaudiam. Em alguns casos eram platéias estúpidas, mas esse é um julgamento feito pela posteridade, então o melhor que o artista faz é não se matar por causa disso, nem perder suas amizades.

Diz um ditado piegas que «com as pedras que me atiraram fiz o meu castelo». Você não precisa fazer um castelo, mas se ficar jogando de volta não ganhará nada. Infelizmente esse tipo metafórico de pedras não serve para fazer castelos, o que é uma grande pena, mas serve para construir metafóricos muros mentais dentro dos quais o grande artista se isola com as pessoas que gostam do que ele faz.

Não sei se isso é errado, sei que não gosto. Queria que mais gente viesse me insultar aqui, enfiar o dedo nas feridas, gritar os meus defeitos.

As poucas coisas que aprendi na vida incluem uma constatação: se fazemos uma escolha certa desde o início é por mera sorte. Em geral deixamos de cair nos buracos porque alguém grita. Mas alguns têm a perseverança de ignorar a gritaria e seguir. Alguns são gênios, mas a maioria só fica teimando em coisas que ninguém quer, e que não sabe fazer direito.

Quem sou eu para julgar qual é o caso, mas reservo-me o direito de gostar do que escolho gostar. Quem vem me pedir que goste de outra coisa deve estar atento: não se pede a um atleticano que torça pelo Cruzeiro «só para ajudar».

1 O nome em português da longsword conhecida dos jogadores de RPG, Skyrim e outros jogos de guerra. O nome inglês evoca apenas o fato de ser comprida, em português se evoca o fato de ela ser tão grande e pesada que normalmente era usada apenas por cavaleiros (daí «montante», a espada que se usa montado a cavalo). Guerreiros excepcionalmente grandes e fortes costumavam lutar usando montantes a pé para intimidar seus inimigos com sua força, mas isso era só uma exibição gratuita de ignorância, sem muito efeito bélico.

2 A piada do motorista barbeiro na Via Dutra. Um motorista seguia pela Via Dutra, enquanto ouvia o rádio e xingava os outros motoristas por suas barbeiragens. O rádio deu a notícia: «Atenção motoristas que trafegam pela Via Dutra no sentido São Paulo/Rio, há um maluco dirigindo pela contramão na altura de Resende.» O motorista ouviu isso e comentou consigo mesmo: «Nossa, eles não sabem de nada! Um só!!!? Ahahah!»


23
Set 12
publicado por José Geraldo, às 21:31link do post | comentar
Um poema satírico inspirado por uma postagem de minha amiga Ana Feijó da Cruz no Facebook.

Eu juro
Sou de um tempo passado,
em que cupcake se chamava bolinho,
blush se chamava ruge,
van era furgão
sale era liquidação.

Nunca me ocorreu
chamar meu amor de love,
nem referência de benchmark,
nem interessado em stakeholder,
nem artigo de paper
e nem discurso de keynote.

Hoje vivo perdido
comendo cigarrette em vez de enroladinho.
Nunca mais vi jogarem bola ao cesto
e nem futebol de salão.

Acho estranho quando chamam
stickers de adesivos e
entrega em domicílio de delivery.
Especialmente se houver alguma coisa free
nos cookies que compro no shopping.

13
Ago 12
publicado por José Geraldo, às 19:27link do post | comentar
Certo escritor nativo de minha cidade natal tinha o hábito de responder, sempre que lhe perguntavam insistentemente se já havia lido o livro de algum jovem autor revelado recentemente, ou os originais submetidos por algum amador: «Eu ainda não tive tempo para terminar de ler Platão [ou Joyce ou Dostoiévski ou algum outro clássico] e você acha que eu já tive tempo de ler isso aí?» Lem­brei desta frase quando hoje tomei conhecimento da iniciativa Movimento em Prol dos Escritores Brasileiros Desconhecidos, divulgada pela Laura Bacellar (que me é tão desconhecida quanto eu devo ser para ela).


Existe um abismo conceitual e humano entre as duas posições. A primeira revela o pragmatismo de alguém que certamente valoriza a qualidade indis­pu­tá­vel dos trabalhos que sobreviveram ao teste do tempo, a segunda prefere a novi­dade. A primeira desconsidera o escritor enquanto ser humano dotado de emo­ções (que o levam, por exemplo, a pegar o seu original e submetê-lo ao crivo de alguém que tem fama de ser mal educado), a segunda se preocupa com tanta gente que está nas sombras enquanto o sol brilha lá fora. A primeira revela auto­ridade, no caso uma autoridade irrelevante, e a segunda revela empatia. Nenhuma das duas contém em si um juízo de valor sobre o que afirma priorizar, pois quem ainda não leu certo autor não tem base para emitir uma opinião sobre ele e quem prioriza os jovens talentos por serem jovens certamente está, entre os tra­ba­lhos lidos, dando atenção imerecida a alguns que mereciam mesmo a som­bra em que vegetam.

Em um mundo ideal não existiriam pessoas medíocres que humilham as outras através de comparações com o inatingível, especialmente considerando que o pró­prio autor em questão jamais esteve, nem jamais estará, aos pés do mais reles dos clássicos cujos nomes nos foram legados dos séculos anteriores. Mas tam­bém, em um mundo ideal, um trabalho não deveria merecer atenção apenas por ser novo. A verdade é que os livros, como quase todos os produtos culturais, são jul­gados principalmente por fatores extrínsecos: capas, temas da moda, sobre­nome do autor, vinculação a uma obra audiovisual, reputação (boa ou «nega­tiva»). Não acredito que a resistência que os novos enfrentam se deva à novi­dade, ou as pessoas estariam comprando os clássicos às toneladas, em vez de lerem J.K. Rowling e Augusto Cury. A questão é, na verdade, um problema de mar­keting.

Quando digo «marketing» eu não estou, de maneira nenhuma, querendo por qual­quer tipo de culpa no autor. Escritores escrevem, revisores revisam, editores edi­tam. Em um mundo ideal autores não editam, revisores não reescrevem e edi­tores não revisam. Mas não vivemos em um mundo ideal, vivemos em um mundo onde a realidade é o imperialismo cultural mal disfarçado, que faz com que uma composição de adolescente mal escrita adquira um status de best-seller em nosso país, mas as nossas próprias composições são encaradas de nariz tor­cido. Ianques e britânicos têm o direito quase exclusivo de escrever certos gêne­ros, e se você quiser praticá-los deverá, no mínimo, ambientar suas histórias fora do país ou anglicizar os nomes dos personagens. Na melhor das hipóteses, pelo menos fuja de nomes muito acentuados, como Conceição, Sebastião, Estêvão ou João. Esse é o mercado em que precisamos nos inserir: é um mercado pre­con­cei­tuoso, racista (ou, no mínimo, anglocêntrico), unilateral (por objetivar subjugar-nos, em vez de assimilar-nos) e amparado em uma imensa indústria cul­tural a que estamos todos expostos desde a mais tenra infância. Querer cul­par o autor tupiniquim por sua «falha» em atingir esse mercado é uma culpabi­li­zação descarada da vítima.

Portanto, quando a Laura Bacellar fala em valorizarmos o trabalho dos jovens auto­res — comprando-os, lendo-os, recomendando-os, falando deles, doando-os a bibliotecas etc. — ela está propondo uma atitude anticíclica. Considerando quão pequeno é o mercado editorial brasileiro (a ponto de obras se tornarem famo­sas por venderem poucas dezenas de milhares de exemplares) e tendo em vista o crescimento acelerado de nosso mercado consumidor nos últimos dez anos (que, infelizmente, ainda não teve impacto suficiente sobre as vendas de pro­dutos culturais, como livros) o que ela está propondo é capaz de fazer mesmo a diferença. Um número relativamente pequeno de adesões (alguns milhares) pode produzir algumas «marolas» de interesse, que levarão a pequenas mudan­ças de curso. À medida em que alguns resultados começarem a aparecer, talvez as editoras percebam que comprar o original de um autor brasileiro é mais lucra­tivo do que pagar os direitos autorais de uma obra estrangeira famosa e ainda custear tradução e revisão. Nesse dia os nossos autores deixarão de estar em desvantagem tão grande contra os enlatados. Continuarão tendo a pena­li­dade de serem menos conhecidos, mas serão mais baratos. Sendo lucrativos o bas­tante, isso já pode abrir inúmeras portas que hoje estão fechadas.

Agora, sinceramente, eu espero que estas portas venham a ser abertas para gente que escreve bem, o que exclui a maior parte da turminha que anda escre­vendo no Orkut e no Facebook.

09
Mai 12
publicado por José Geraldo, às 22:30link do post | comentar | ver comentários (1)

Uma verdade sobre a qual pouco se reflete é que existe, de fato, uma diferença abismal entre ter a capacidade de fazer alguma coisa e saber fazê-la bem. Em geral as pessoas estão mais preocupadas em conseguir fazer do que em passar além disso e fazer bem. É um tipo de «estética punk» que valoriza mais a «atitude» do que a habilidade. Os punks, como se sabe, eram músicos que tinham inveja do dinheiro que ganhavam bandas como o Led Zeppelin e o Yes mas, não sabendo tocar nem a décima parte do que o Steve Howe fazia com o pé esquerdo enquanto via televisão, fizeram um ataque calhorda a esses grupos acusando-os justamente de terem se afastado da juventude por tocarem uma música «elitista» e ganharem rios de grana com ela. No fundo o que eles chamavam de «elitismo» era a capacidade de tocar bem os seus instrumentos.

Os punks não foram os inventores do despeito — apenas os seus mais conhecidos e bem sucedidos praticantes nas últimas décadas — mas uma ideia, quando solta no mundo, ganha asas e cresce até chegar a lugares onde o seu criador original nem sonhava. Imagino que alguns músicos dos primórdios do movimento punk tenham aprendido a tocar melhor desde então e passaram a respeitar sujeitos como o Jimmy Page; ao mesmo tempo em que devem sentir arrelia nos dentes ao ouvir boa parte da música de hoje — e que só existe porque muita gente entrou pelo buraco que os punks arrombaram no muro que separa a mediocridade do sucesso. Exemplos dessa evolução não faltam lá fora: Robert Smith, do The Cure, não suporta ouvir o primeiro disco de sua banda, e David Byrne, do Talking Heads, largou a música e virou produtor (sendo responsável pela divulgação nos EUA do trabalho de gente como o nosso Tom Zé).

Estes dois parágrafos iniciais, que certamente só farão pleno sentido para quem entende algo de música, servem de introdução para uma constatação que me sobreveio hoje ao receber mais uma «revista eletrônica» (recebo umas seis ou sete por semana, algumas anexadas ao e-mail, outras com uma educada hiperligação me convidando a baixá-la de um servidor na internet). A constatação de que, no ramo das publicações amadoras, ninguém mais se importa em fazer bem feito. Pode-se fazer feio, que é falta de educação dizer isso. Só que eu sou mesmo mal educado e não me acanho de dizer: a maioria das publicações independentes padece de uma feiura que dói nos olhos.

Claro que eu não espero que alguém que faz uma revista amadora tenha capacidade de dar-lhe um acabamento do nível de uma revista semanal publicada por uma grande editora. Não há tempo para isso e certamente os editores amadores não têm grana para comprar os programas profissionais necessários para tanto (e mesmo que os obtenham pela via da pirataria, não terão tempo para aprendê-los até chegarem ao mesmo nível de um profissional gráfico). Mas existem certos erros básicos, que poderiam ser evitados com sensibilidade (para observar como são feitas as revistas profissionais), alguma pesquisa sobre o tema (para conhecer o bê-a-bá da formatação de documentos) e uma certa dose de talento (que nem todo mundo tem). Sem sensibilidade, talento e conhecimento; o resultado é que as revistas eletrônicas amadoras são frequentemente feias, e feias de doer, e ficam mais feias ainda se o leitor resolver imprimir para ler em papel ou distribuir (o que algumas delas chegam a implorar que o leitor faça). Eu acho que não existe desculpa para isso: basta pensar no que significa «amador». Se o amador é alguém que «ama» fazer aquilo que se propõe a fazer, então é de se esperar que o amador se dedique. Quem ama se dedica. E quem se dedica procura o conhecimento, trabalha a sua sensibilidade, aprimora o talento. Com bastante conhecimento e alguma sensibilidade, compensa-se bastante a insuficiência do talento, por exemplo. Portanto, ainda que seja desculpável a falta de talento, nada desculpa a ignorância. Nada. Principalmente nos dias de hoje, em que se pode achar informação sobre quase tudo na internet.

Eu mesmo já abordei em vezes anteriores (Formatando Páginas com a Medida Áurea e Medida Áurea e Páginas Confortáveis) alguns temas relacionados à formatação, sempre ressaltando que as «regras» de formatação de documentos não são arbitrárias, mas baseadas em boas práticas que resultam em textos mais agradáveis de ler. Por exemplo: existe uma ciência na quantidade máxima de letras por linha e de linhas por página, uma ciência que, inclusive, se baseia na fisiologia, que explica o funcionamento do olho humano. Mas o amador dirá que essas «firulas» não são importantes, que o importante é ter realizado algo. É um raciocínio que seria respeitável em um mundo onde poucos fizessem alguma coisa. Com tantas facilidades oferecidas hoje pelos computadores, realmente parece haver muita gente fazendo e-zines amadores. Diante desta realidade este raciocínio é uma condenação à mediocridade. Por favor não incluam textos meus neste tipo de publicação. Nos fanzines de antigamente, penosamente xerocados, muitas vezes escritos à mão por falta até de máquina de escrever, havia lugar para a feiura e eu não me importava de ser publicado ali. Mas nesses de hoje, produzidos aos montes usando qualquer editor de textos, a feiura é apenas falta de vontade de evoluir. E me importa aparecer em um trabalho feito por alguém que não se importa com a qualidade.

A estética do «faça você mesmo» impede que o amador evolua. O simples ato de fazer parece bastar. Não há um objetivo ulterior, de superar, de melhorar, de fazer algo que simplesmente faça a diferença em um mundo tosco, onde cada vez mais as pessoas pensam menos em realizar e mais em «fazer». Um mundo no qual os amadores não amam o que fazem, pois não estão ganhando nada com isso. Um mundo, em suma, no qual o amor verdadeiro só é oferecido por aqueles que cobram por isso. Triste mundo esse, em quesó as prostitutas fazem amor direito. Esta frase final eu dedico ao meu amigo Ronaldo Roque, que a inspirou.


20
Fev 12
publicado por José Geraldo, às 12:34link do post | comentar | ver comentários (1)

Esta semana tive o prazer de ler o mais novo conto deste jovem autor. Como de todas as outras vezes, me restou o queixo caído e uma profunda inveja. Inveja positiva, não essa inveja que tenta apagar o sol alheio que incomoda sua treva pessoal. Tive deixar-lhe um comentário, que aqui reproduzo.

Felipe, eu não preciso repetir o que penso de sua obra. Você sabe muito bem que, em certos momentos, eu quase tenho vontade de lhe pedir um autógrafo. Este conto foi um desses momentos.

Um autor se torna grande quando consegue escrever uma grande obra sem ter uma "grande" história. Um autor pequeno vai procurar escrever, no mínimo, sobre o fim da civilização ou a destruição até de um universo. Seus personagens precisarão ser fisicamente gigantes para esconderem a pequenez de sua alma.

Mas o grande autor não precisa de histórias 'grandes' e nem de 'grandes' histórias, ele engrandece as histórias que escolhe contar, mais ou menos como o músico habilidoso que pega um tema popular e o transformar em uma sinfonia. Não pense encontrar nada parecido com as Rapsódias Húngaras de Liszt no folclore da Hungria, nem que os caipiras toquem rabeca e viola como em uma bachiana de Villa-Lobos.

Esse seu texto é absolutamente um exemplo da razão pela qual eu acho que você é, ou ainda será, um grande autor. Não existe absolutamente NADA nele além de seu talento. Ninguém morre, ninguém nasce, nenhuma civilização desaparece, nenhum vampiro se transforma em lobisomem ou coisa parecida. Está o leitor apenas diante dos meandros de sua alma sofisticada e das histórias absolutamente banais, porém universais, que você capta no dia a dia.

Essa sua característica tem algo de Machado de Assis. Sua ficção evoca fortemente o melhor da obra machadiana no aspecto do romanceamento do nada ou do quase-nada. Se você não prestar muita atenção à leitura de Dom Casmurro poderá achar que é apenas a biografia de um resmungão que nada viveu. O mesmo se passa com esse seu conto, entre tantos outros: somente quem lê com talento (é preciso um certo talento para ler) perceberá as minuciosas mudanças e tragédias que ocorrem no fundo da alma dos dois personagens.

A incompreensão de seu protagonista também me evoca o Mersault, d'O Estrangeiro, que matou um desconhecido porque "o sol estava quente". Este estranhamento do homem em relação à própria vida, e à alheia. Todos os seus personagens são absolutamente trágicos, mas não precisam matar e nem matar-se para isso: o modo como vivem é a própria tragédia.

Parabéns por este conto, e confesso que já estou começando inconscientemente a me tornar seu imitador.


08
Jan 12
publicado por José Geraldo, às 20:40link do post | comentar | ver comentários (1)

Na qualidade de desconhecido pessoal de mais de noventa por cento de meus amigos virtuais,1 decidi estabelecer uma série de parâmetros através dos quais classificarei os conteúdos digitais que lerei. Obviamente tais parâmetros são necessários, pois o volume de informações na rede sendo tão grande, querer ler tudo seria como tentar uma coleção filatélica geral.2

Os parâmetros a que me refiro são, obviamente, arbitrários. Como minha vida é algo total e pessoalmente meu, reservo-me ao direito de fazer escolhas baseadas em critérios coerentes somente com as coisas em que creio.3 Reunindo em um conjunto único todos os meus conceitos, preconceitos e defeitos, proclamei os seguintes parâmetros para inclusão de blogs no meu blogroll e para inclusão de amigos no meu amigoroll.

Título em inglês
Não leio e não adiciono blogues com título em inglês. A menos, é claro, que sejam integralmente escritos em inglês, de preferência um inglês tão correto quanto o de um apresentador de notícias da BBC. Acho vulgar, pedante e tosco usar termos em qualquer estrangeirês para dar um verniz de «curtura» ou de «féchion» para qualquer coisa. Acho vomitivamente vulgar o xampu «Head & Shoulders». Eu ia pensando em dizer que acho isso «caipira», mas pensando melhor, não. Por outro lado, se o título for em uma língua exótica, como romeno, finlandês, vietnamita, curdo ou guarani eu até vou ler, mas dificilmente adicionarei.
Título em caixa alta
Escrever tudo em maiúsculas é uma maneira de chamar a atenção sem mostrar conteúdo. Você quer que o seu blogue apareça mais que os outros nas listas então ESCREVE O NOME GRANDÃO ASSIM. Isso é desrespeitoso com os outros pobres mortais que não tiveram esta brilhante ideia.4
Miguxês
Não gosto de conviver com idiotas. Ninguém gosta. Escrever com excesso de deformação ortográfica das palavras, inclusive dizendo ser uma questão de estilo, dá impressão de idiotice. Você precisa ser no mínimo um talento do tamanho do Guimarães Rosa para poder escrever fora da norma ortográfica sem parecer um fugitivo do Mobral.5
Mensagens de Pensamento Positivo
Nada tenho contra quem gosta dessas xaropadas pseudo qualquer coisa psicológicas baseadas em rasas leituras de auto-ajuda e versículos bíblicos. Se você gosta, afogue-se nisso e seja feliz. Mas eu não gosto. Minha opinião sobre auto-ajuda não é sequer publicável. Cada um com seus «pobrema» e cada um acha suas soluções. Quando não acha, procura. Soluções insistentemente chegando a domicílio são apenas uma fonte de incômodo.
Umbiguismo
Algumas pessoas gastam horas preciosas cada dia refletindo sobre o quanto são maravilhosas, fodásticas, bonitas, bem-vestidas, invejadas, ricas e bem-comidas (ou bem servidos, conforme o sexo). Gostaria de dizer a estas pessoas que, mesmo que eu concorde com um ou dois desses adjetivos, não tenho nenhum interesse em acompanhar cada dia a crônica de seus penteados, roupas, transas, tratamentos cosméticos ou festas chiquérrimas. Estou interessado no que as pessoas têm a dizer. Eu até poderia estar interessado em rostinhos bonitos e temperamentos desinibidos, se eu fosse solteiro e os donos de ambas as características não vivessem em outro estado, país ou planeta. Como não é assim, não se importe, por favor, se eu não quiser fazer papel de espelho diante de seu desfile de sensacionalidade.
Metralhadores de textos
Confesso que já fui um desses,6 mas detesto gente que posta vinte coisas por dia. Especialmente quem posta vinte coisas irrelevantes por dia. Eu quero seguir blogues que postem quatro ou cinco textos por semana, se muito.

1 Por extenso, porque só quero ser lido e compreendido por quem presta atenção no que lê.

2 Este blogueiro teria grande prazer em ser lido por pessoas que sabem o que é uma «coleção filatélica geral», e um prazer supremo em ser lido por pessoas que já tentaram fazer uma «coleção filatélica», de qualquer tipo.

3 Isto inclui achar tosco e primitivo um funk com melodia de dois ou três acordes, mas ao mesmo tempo ter orgasmos sonoros ouvindo uma canção do Ramones, do Clash ou do Joy Division. E se você não entendeu a associação, está na hora de expandir seu horizonte musical.

4 Escrever em maiúsculas é como gritar. Imagine-se em uma sala onde todos estão falando civilizadamente, cada um pedindo licença na sua vez. Então uma pessoa começa a gritar sem pedir licença. Obviamente todos vão ouvi-la, já que não podem bloquear os ouvidos. Mas se todos começarem a gritar do mesmo jeito, ninguém mais ouve ninguém.

5 Este blogueiro dá certa importância a pessoas que sabem o que foi o Mobral. Não para discriminar quem se beneficiou dele, mas porque as pessoas que têm este conhecimento também conhecem uma série de outras coisas a respeito de uma época triste de nossa História, mas cara a esse que vos escreve.

6 Não há nada de errado nisso. Eu não sou obrigado a querer nos outros aquilo que eu tenho/tive em mim.


07
Jan 12
publicado por José Geraldo, às 00:11link do post | comentar

Esta foi uma pergunta que me fiz durante um bom tempo. Esta postagem pretende esclarecer a resposta, com números frios e inquestionáveis. Mas antes de passar aos números gostaria de, primeiro, colocar na mesa as cartas que vou jogar, para que fique clara a linha de raciocínio que pretendo seguir.

Tipos de recompensa que o blogueiro pode esperar

Entendo que há três tipos de recompensa a que pode aspirar quem publica conteúdo na internet, a saber: notoriedade, remuneração e autossatisfação. Acredito que os termos são de uso corrente e é quase desnecessário defini-los para o público em geral. Mesmo assim, para que não reste sombra de dúvida de meu caminho, vou defini-los segundo o meu entendimento.

O blogueiro busca notoriedade quando pretende que o conteúdo de seu blogue repercuta e lhe franqueie acesso a editoras, imprensa ou algo assim. Quer remuneração quando pretende ganhar os caraminguás do AdSense ou fazer contratos de publicidade. Estas são as duas principais formas de recompensa a que um blogueiro aspira. Ambas estão interligadas, unha e carne entre si, embora não de forma automática. Quem atinge notoriedade costuma obter remuneração. Não necessariamente ocorre o mesmo na situação inversa: blogue pode render dinheiro e ser irrelevante. Não necessariamente ocorre uma coisa como consequência da outra: blogues relevantes podem não render dinheiro, ou render menos do que o blogueiro espera. A relação que ocorre é que dificilmente se ganha dinheiro com um blogue irrelevante, desconhecido.

Sobre a terceira forma de recompensa eu não vou falar porque ela já está superada para mim. Já não faço coisa alguma pensando em apenas «mostrar para os amigos» ou obter algum tipo de prazer narcisístico em «estar na web». Desta forma, deixo claro aqui que minha análise sobre «valer a pena» se refere exclusivamente aos dois primeiros aspectos.

Os blogues não são todos iguais, nem os blogueiros

Não pretendo me comparar livremente com qualquer outro cidadão da blogosfera. Tenho consciência de minhas limitações, inclusive geográficas. Não espero ter o mesmo tipo de repercussão que um blogueiro da moda que frequenta as festas das capitais, tem amizades em jornais e está perfeitamente antenado com o momento. Especialmente tenho consciência de que blogues de literatura não são como blogues de humor, de informática ou mesmo de contos eróticos. A literatura atinge um público menor e específico. Obviamente não criei meu blogue esperando ter vinte mil visitas diárias e ganhar três mil reais por mês só com AdSense. Suponho até que casos assim — no Brasil — são invenção de blogueiro boquirroto que gosta de gabar-se.

Existe um segundo aspecto de diferença envolvido: o já citado elemento geográfico. Uma vez que a maior parte do público da internet se localiza nas grandes cidades, especialmente Rio de Janeiro e São Paulo, parece-me natural que blogueiros ali também localizados tenham mais facilidade de acesso ao público, por falarem de assuntos que dizem respeito a esse público. Reza a lenda, porém, que a internet tem o poder de derrubar estas barreiras culturais e apresentar o nosso trabalho ao mundo, e que blogues são úteis para isso. Meu blogue foi, de certa forma, um experimento nesse sentido.

O que eu realmente esperava obter

Sendo verdade a ideia de que a internet remove barreiras culturais e franqueia acesso ao mundo para quem está isolado no interior — e eu acredito que isto seja verdade — meu objetivo era avaliar em que medida este efeito se sente, e se vale a pena confiar nele para, através de um blogue, romper a casca de indiferença com que a capital olha para o interior. Então, de forma simplista, poderia dizer que meu objetivo era, com o blog, obter um público, pequeno que fosse.

Delimitação do experimento

O blogue «Letras Elétricas» foi criado em 19 de agosto de 2010 a partir de um blogue anterior, chamado «Maldição Eletrônica», no qual eu escrevia sobre a utilização de ferramentas específicas de linha de comando, como o LaTeX, para produzir lay-outs profissionais de livros e revistas. Com o tempo foi rareando meu interesse no tema e, com os problemas que meu antigo site estava tendo desde que o serviço de hospedagem fizera upgrade de seus servidores, acabei começando a postar textos literários nele. Então, no dia 19 de agosto de 2010, mudei o nome e a URL do blogue, acrescentando-lhe também contador de visitas (oculto) e AdSense.

Os dados utilizados para as estatísticas que vou analisar foram coletados entre 01 de setembro de 2010 e 31 de dezembro de 2011, um total de 487 dias. Optei por não considerar os dados referentes ao mês de agosto de 2010. Não apenas por ser um mês incompleto, mas também porque acredito que não havia, ainda, tendências estabelecidas que valesse a pena analisar.

Resultados

Ao final do artigo há um gráfico contendo uma visualização dos dados que passarei a analisar. Você pode consultá-lo para compreender melhor as tendências que detectei. Eis uma tabulação dos dados coletados junto ao Analytics:

scoped>.bld, .mrg, .top, .bdy, .btm {font-family: inherit; font-size: 75%}.bld, .mrg, .top {text-align: center; color: white; background: #250302;}.bld, .mrg {border-top: 2px solid#250302; font-weight: bold; vertical-align: top}.mrg {border-bottom: 1px solid #250302;}.bld {border-bottom: none}.top {border-bottom: 1px solid #250302; vertical-align: bottom}.bdy {background: #cbb; color: black}.btm {border-top: 1px solid #250302; border-bottom: 2px solid #250302; background: white; color: black; vertical-align: bottom}.ctr {text-align: center}.rgt {text-align: right}.brd {border-right: 1px solid#250302; }

10
Dez 11
publicado por José Geraldo, às 18:40link do post | comentar

Se você acredita que alguém vai mandar vinte e cinco centavos para a família de uma criança com algum tipo de problema grave de saúde, parabéns, champz!, pode continuar compartilhando, mas eu não faço isso.

Primeiro porque a função do Facebook não é essa de ganhar centavinhos para famílias necessidades, segundo porque essa história é antiga e não passa de uma farsa criada por desocupados sem noção e só serve para poluir todo ambiente de convivência virtual.

Isso acaba funcionando porque a maioria das pessoas acha algo muito moralmente bonito dar um clique para "ajudar". Um clique não custa nada, não doi, e não envolve o «nojinho» de ficar perto de uma dessas pessoas. É como a história do "Mandarim" do Eça de Queirós. Aperte este botão e um rico mandarim morrerá na China e você receberá sua herança milionária. Apertar o botão é fácil, você não verá a morte do sujeito, não terá que conviver com as consequências da miséria de sua família. Então aperte-se o botão! No caso destas campanhas você não recebe uma herança milionária, mas uma consolação moral, a auto-satisfação de achar que está fazendo alguma coisa para ajudar alguém, mesmo que esta alguma coisa seja um mero clique, cujas consequências você não enxerga e não tem como controlar. É um tipo de fé: eu acredito que com esse clique eu salvei o menininho deformado, mesmo tendo me negado na semana passada a doar para a APAE ou para o Asilo da minha cidade. A salvação do distante me consola na minha convivência com o próximo necessitado.

Boa sorte a você que acha que de clique em clique vai salvando o mundo. Eu já desisti de argumentar com a fé cega das pessoas.


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