Em um mundo eternamente provisório, efêmeras letras elétricas nas telas de dispositivos eletrônicos.
13
Ago 12
publicado por José Geraldo, às 19:27link do post | comentar
Certo escritor nativo de minha cidade natal tinha o hábito de responder, sempre que lhe perguntavam insistentemente se já havia lido o livro de algum jovem autor revelado recentemente, ou os originais submetidos por algum amador: «Eu ainda não tive tempo para terminar de ler Platão [ou Joyce ou Dostoiévski ou algum outro clássico] e você acha que eu já tive tempo de ler isso aí?» Lem­brei desta frase quando hoje tomei conhecimento da iniciativa Movimento em Prol dos Escritores Brasileiros Desconhecidos, divulgada pela Laura Bacellar (que me é tão desconhecida quanto eu devo ser para ela).


Existe um abismo conceitual e humano entre as duas posições. A primeira revela o pragmatismo de alguém que certamente valoriza a qualidade indis­pu­tá­vel dos trabalhos que sobreviveram ao teste do tempo, a segunda prefere a novi­dade. A primeira desconsidera o escritor enquanto ser humano dotado de emo­ções (que o levam, por exemplo, a pegar o seu original e submetê-lo ao crivo de alguém que tem fama de ser mal educado), a segunda se preocupa com tanta gente que está nas sombras enquanto o sol brilha lá fora. A primeira revela auto­ridade, no caso uma autoridade irrelevante, e a segunda revela empatia. Nenhuma das duas contém em si um juízo de valor sobre o que afirma priorizar, pois quem ainda não leu certo autor não tem base para emitir uma opinião sobre ele e quem prioriza os jovens talentos por serem jovens certamente está, entre os tra­ba­lhos lidos, dando atenção imerecida a alguns que mereciam mesmo a som­bra em que vegetam.

Em um mundo ideal não existiriam pessoas medíocres que humilham as outras através de comparações com o inatingível, especialmente considerando que o pró­prio autor em questão jamais esteve, nem jamais estará, aos pés do mais reles dos clássicos cujos nomes nos foram legados dos séculos anteriores. Mas tam­bém, em um mundo ideal, um trabalho não deveria merecer atenção apenas por ser novo. A verdade é que os livros, como quase todos os produtos culturais, são jul­gados principalmente por fatores extrínsecos: capas, temas da moda, sobre­nome do autor, vinculação a uma obra audiovisual, reputação (boa ou «nega­tiva»). Não acredito que a resistência que os novos enfrentam se deva à novi­dade, ou as pessoas estariam comprando os clássicos às toneladas, em vez de lerem J.K. Rowling e Augusto Cury. A questão é, na verdade, um problema de mar­keting.

Quando digo «marketing» eu não estou, de maneira nenhuma, querendo por qual­quer tipo de culpa no autor. Escritores escrevem, revisores revisam, editores edi­tam. Em um mundo ideal autores não editam, revisores não reescrevem e edi­tores não revisam. Mas não vivemos em um mundo ideal, vivemos em um mundo onde a realidade é o imperialismo cultural mal disfarçado, que faz com que uma composição de adolescente mal escrita adquira um status de best-seller em nosso país, mas as nossas próprias composições são encaradas de nariz tor­cido. Ianques e britânicos têm o direito quase exclusivo de escrever certos gêne­ros, e se você quiser praticá-los deverá, no mínimo, ambientar suas histórias fora do país ou anglicizar os nomes dos personagens. Na melhor das hipóteses, pelo menos fuja de nomes muito acentuados, como Conceição, Sebastião, Estêvão ou João. Esse é o mercado em que precisamos nos inserir: é um mercado pre­con­cei­tuoso, racista (ou, no mínimo, anglocêntrico), unilateral (por objetivar subjugar-nos, em vez de assimilar-nos) e amparado em uma imensa indústria cul­tural a que estamos todos expostos desde a mais tenra infância. Querer cul­par o autor tupiniquim por sua «falha» em atingir esse mercado é uma culpabi­li­zação descarada da vítima.

Portanto, quando a Laura Bacellar fala em valorizarmos o trabalho dos jovens auto­res — comprando-os, lendo-os, recomendando-os, falando deles, doando-os a bibliotecas etc. — ela está propondo uma atitude anticíclica. Considerando quão pequeno é o mercado editorial brasileiro (a ponto de obras se tornarem famo­sas por venderem poucas dezenas de milhares de exemplares) e tendo em vista o crescimento acelerado de nosso mercado consumidor nos últimos dez anos (que, infelizmente, ainda não teve impacto suficiente sobre as vendas de pro­dutos culturais, como livros) o que ela está propondo é capaz de fazer mesmo a diferença. Um número relativamente pequeno de adesões (alguns milhares) pode produzir algumas «marolas» de interesse, que levarão a pequenas mudan­ças de curso. À medida em que alguns resultados começarem a aparecer, talvez as editoras percebam que comprar o original de um autor brasileiro é mais lucra­tivo do que pagar os direitos autorais de uma obra estrangeira famosa e ainda custear tradução e revisão. Nesse dia os nossos autores deixarão de estar em desvantagem tão grande contra os enlatados. Continuarão tendo a pena­li­dade de serem menos conhecidos, mas serão mais baratos. Sendo lucrativos o bas­tante, isso já pode abrir inúmeras portas que hoje estão fechadas.

Agora, sinceramente, eu espero que estas portas venham a ser abertas para gente que escreve bem, o que exclui a maior parte da turminha que anda escre­vendo no Orkut e no Facebook.

08
Jan 12
publicado por José Geraldo, às 20:40link do post | comentar | ver comentários (1)

Na qualidade de desconhecido pessoal de mais de noventa por cento de meus amigos virtuais,1 decidi estabelecer uma série de parâmetros através dos quais classificarei os conteúdos digitais que lerei. Obviamente tais parâmetros são necessários, pois o volume de informações na rede sendo tão grande, querer ler tudo seria como tentar uma coleção filatélica geral.2

Os parâmetros a que me refiro são, obviamente, arbitrários. Como minha vida é algo total e pessoalmente meu, reservo-me ao direito de fazer escolhas baseadas em critérios coerentes somente com as coisas em que creio.3 Reunindo em um conjunto único todos os meus conceitos, preconceitos e defeitos, proclamei os seguintes parâmetros para inclusão de blogs no meu blogroll e para inclusão de amigos no meu amigoroll.

Título em inglês
Não leio e não adiciono blogues com título em inglês. A menos, é claro, que sejam integralmente escritos em inglês, de preferência um inglês tão correto quanto o de um apresentador de notícias da BBC. Acho vulgar, pedante e tosco usar termos em qualquer estrangeirês para dar um verniz de «curtura» ou de «féchion» para qualquer coisa. Acho vomitivamente vulgar o xampu «Head & Shoulders». Eu ia pensando em dizer que acho isso «caipira», mas pensando melhor, não. Por outro lado, se o título for em uma língua exótica, como romeno, finlandês, vietnamita, curdo ou guarani eu até vou ler, mas dificilmente adicionarei.
Título em caixa alta
Escrever tudo em maiúsculas é uma maneira de chamar a atenção sem mostrar conteúdo. Você quer que o seu blogue apareça mais que os outros nas listas então ESCREVE O NOME GRANDÃO ASSIM. Isso é desrespeitoso com os outros pobres mortais que não tiveram esta brilhante ideia.4
Miguxês
Não gosto de conviver com idiotas. Ninguém gosta. Escrever com excesso de deformação ortográfica das palavras, inclusive dizendo ser uma questão de estilo, dá impressão de idiotice. Você precisa ser no mínimo um talento do tamanho do Guimarães Rosa para poder escrever fora da norma ortográfica sem parecer um fugitivo do Mobral.5
Mensagens de Pensamento Positivo
Nada tenho contra quem gosta dessas xaropadas pseudo qualquer coisa psicológicas baseadas em rasas leituras de auto-ajuda e versículos bíblicos. Se você gosta, afogue-se nisso e seja feliz. Mas eu não gosto. Minha opinião sobre auto-ajuda não é sequer publicável. Cada um com seus «pobrema» e cada um acha suas soluções. Quando não acha, procura. Soluções insistentemente chegando a domicílio são apenas uma fonte de incômodo.
Umbiguismo
Algumas pessoas gastam horas preciosas cada dia refletindo sobre o quanto são maravilhosas, fodásticas, bonitas, bem-vestidas, invejadas, ricas e bem-comidas (ou bem servidos, conforme o sexo). Gostaria de dizer a estas pessoas que, mesmo que eu concorde com um ou dois desses adjetivos, não tenho nenhum interesse em acompanhar cada dia a crônica de seus penteados, roupas, transas, tratamentos cosméticos ou festas chiquérrimas. Estou interessado no que as pessoas têm a dizer. Eu até poderia estar interessado em rostinhos bonitos e temperamentos desinibidos, se eu fosse solteiro e os donos de ambas as características não vivessem em outro estado, país ou planeta. Como não é assim, não se importe, por favor, se eu não quiser fazer papel de espelho diante de seu desfile de sensacionalidade.
Metralhadores de textos
Confesso que já fui um desses,6 mas detesto gente que posta vinte coisas por dia. Especialmente quem posta vinte coisas irrelevantes por dia. Eu quero seguir blogues que postem quatro ou cinco textos por semana, se muito.

1 Por extenso, porque só quero ser lido e compreendido por quem presta atenção no que lê.

2 Este blogueiro teria grande prazer em ser lido por pessoas que sabem o que é uma «coleção filatélica geral», e um prazer supremo em ser lido por pessoas que já tentaram fazer uma «coleção filatélica», de qualquer tipo.

3 Isto inclui achar tosco e primitivo um funk com melodia de dois ou três acordes, mas ao mesmo tempo ter orgasmos sonoros ouvindo uma canção do Ramones, do Clash ou do Joy Division. E se você não entendeu a associação, está na hora de expandir seu horizonte musical.

4 Escrever em maiúsculas é como gritar. Imagine-se em uma sala onde todos estão falando civilizadamente, cada um pedindo licença na sua vez. Então uma pessoa começa a gritar sem pedir licença. Obviamente todos vão ouvi-la, já que não podem bloquear os ouvidos. Mas se todos começarem a gritar do mesmo jeito, ninguém mais ouve ninguém.

5 Este blogueiro dá certa importância a pessoas que sabem o que foi o Mobral. Não para discriminar quem se beneficiou dele, mas porque as pessoas que têm este conhecimento também conhecem uma série de outras coisas a respeito de uma época triste de nossa História, mas cara a esse que vos escreve.

6 Não há nada de errado nisso. Eu não sou obrigado a querer nos outros aquilo que eu tenho/tive em mim.


20
Mar 11
publicado por José Geraldo, às 15:53link do post | comentar | ver comentários (1)

id="BLOGGER_PHOTO_ID_5586243765800461890" />Recebi do amigo Raylson Bruno o selo de qualidade do Caderneta Azul. Gostaria de me desculpar com o Raylson e com o pessoal do selo por ter demorado tanto a responder. Acontece que a mensagem tinha caído na caixa de spam e eu estava distraído com as pequenas mudanças deste meu blog e não percebi. Bem, segundo entendi, o caso deste selo é parecido com o do outro selo que eu ganhe: trata-se de postar o selo, responder às perguntas e repassá-lo para outros blogs que eu considere que mereçam e ainda não têm. Começamos pelas perguntas:

Nome
José Geraldo Gouvêa
Uma música:
No momento eu estou gostando muito de Death of Mother Nature, do Kansas
Humor:
De modo geral, afável; mas com tendência a tornar-se rabugento na presença de dor, ruído ou música ruim (que é uma combinação dos dois).
Uma cor
Roxo
Estação:
Outono
Como prefiro viajar:
De carro
Um lugar:
Minha casa
Um filme
Blade Runner
Um livro
A Relíquia (Eça de Queirós), mas que fique claro que acho impossível citar um livro apenas: deve haver pelo menos mais vinte que eu precisaria citar
Um prazer:
A vida é bela
Um seriado
Não assisto mais seriados americanos e nunca gostei dos brasileiros
Time do coração
Clube Atlético Mineiro
Frase mais usada
“Se vendessem silêncio a quilo eu gastava tudo que tenho para fazer um bom estoque”
Porque tem um blog
Porque é uma maneira simples e gratuita de divulgar meu trabalho
Sobre o que escreve
Sobre as coisas que vejo e que sonho, tudo sob uma ótica pessoal e regionalista (até minha ficção científica procura uma linguagem “mineira”, embora nem sempre ache)
Escreva a primeira coisa que vier a cabeça
Nunca escrevo nem digo as coisas imediatas que me vêm à cabeça. Por isso eu cochicho tanto sozinho: preciso degustar e avaliar as palavras antes de libertá-las para o mundo. Não, eu não sou louco.
O que achou do selo
Gostei da iniciativa, apreciei o design.

Tendo respondido às perguntas, segue a lista dos blogs. Embora da outra vez alguns blogs para os quais eu dei o selo “Stylish Blogger” não o tenham aceitado, isto não impedirá que eventualmente algum deles apareça na lista abaixo. Isto se dá por duas razões: a) eu não fui checar quem aceitou e nem fiquei ofendido com recusas e b) merecimento é merecimento.

assuntos:

03
Dez 10
publicado por José Geraldo, às 23:05link do post | comentar | ver comentários (2)

Eu recebi de Åsa Heuser, do blog «Uma Atéia de Bom Humor» este selo aí abaixo. Embora eu não seja do tipo que gosta de correntes, resolvi participar desta por três boas razões: 1) não custa nada, 2) é uma boa maneira de divulgar meu blog e também outros blogs legais que a gente vê por aí e 3) eu não faria essa desfeita à Åsa...

Aceitar o selo envolve três condições: a) agradecer, b) partilhar sete coisas a meu respeito e c) indicar dez blogues para presentear com o selo. Vamos lá.a) Muito obrigada, Åsa, por lembrar-se do meu blogue entre os que você visita frequentemente. Reconhecimento é sempre bom, mas é melhor quando vem de uma alma sensível.b) Sete coisas que pouca gente sabe sobre mim.
  1. Já sofri preconceito por meu falar mineiro
  2. Os únicos empregos fixos que tive na vida (mais de um ano com carteira assinada) foram em bancos
  3. Eu não fiz TCC quando me formei em História porque na época não era exigido
  4. Repeti seis vezes o exame prático para motorista
  5. Sempre tive imensa dificuldade para executar todo e qualquer tipo de trabalho manual/artesanato, a não ser desenhar,
  6. Eu fui «diagnosticado» como médium em um centro espírita, mas não incorporei nenhuma entidade em seis meses de participação nas reuniões, por isso desisti do espiritismo kardecista
  7. Sei botar tarô, fazer leitura fria e ler mãos (em qualidade decrescente)
c) Os dez blogues que indico são:
  1. Sofá do Isaías - de Isaías de Souza
  2. Estórias Pacatas - de Ronaldo Brito Roque;
  3. Estou numa Ilha Deserta - de Felipe Holloway;
  4. Blogue do Bruggerman - de Fábio Bruggerman;
  5. Letra, Papel - de Sérgio Ferrari
  6. Vida Besta e Ordinária - de José Abraão;
  7. Lesma de Sofá - da Elaine (pseudônima);
  8. Contos Agridoces - de Rubem Cabral;
  9. Domine o Público - de Vinícius Gonçalves;
  10. Lendo e Relendo Lenise Resende - de Lenise Resende;
Não coloquei os blogues em nenhuma ordem específica, mas gostaria de ressaltar que o Isaías e o Ronaldo eu conheço pessoalmente e por isso eu pus no topo da lista.
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